segunda-feira, 24 de março de 2014

Astro Rei ( o desejado)

 
Imagens da Net
 

Era uma vez um rei chamado Sol. Todos o conhecem. Todos o estimam.
Poderosos, os seus raios são espadas. Majestosos, os seus raios são de ouro e mais do que todo o ouro valem. Generosos, os seus raios são fios de vida.
Poderoso, majestoso e generoso era este rei, mas tinha um grande desgosto – os seus quatro filhos davam-se muito mal uns com os outros.
Chamavam-se os quatro irmãos, por ordem de idade, a começar pelo mais novo: Primavera, Verão, Outono e Inverno. Bulhavam constantemente, porque todos queriam, à uma, governar a Terra. Ora isto não podia ser.
Assim pensando, o rei Sol decidiu que cada um deles governasse por sua vez, durante um certo tempo. As ordens de um pai, para mais rei, e ainda por cima Sol, têm de se cumprir.
O Outono não gostava desta partilha. Queixava-se de que lhe não davam tempo... Ainda estava ele a arrumar e a alindar a casa, pintando tudo da cor púrpura, em tons e meios-tons amarelos doirados, e já o Inverno lhe batia à porta. Então o Outono tinha uma birra e arrancava as folhas das árvores, algumas ainda por pintar...
Saía o Outono com lágrimas nos olhos e entrava o Inverno.
— Em que desordem isto está — exclamava ele, irritado. E punha-se a varrer. Varria com tanta força que fazia vento. Depois lavava, em grandes bátegas, caídas do céu... As sementes e os grãozinhos, que o Outono deitara à terra, assustavam-se:
— Iremos nós também na cheia? — Perguntavam uns para os outros.
O Inverno ouvia-os e dizia-lhes:
— Sosseguem! Durmam descansados. Vai tudo dormir um longo sono. Assim tem de ser.
E tão carinhoso ele era que cobria os lugares mais desprotegidos da terra com um manto branco de neve.
Lá fora, a Primavera impacientava-se. Não tinha feitio para suportar os vagares do irmão. Às vezes, não se continha que não perguntasse pela frincha da porta:
— Já posso?
                                          


Ainda era cedo, mas só de lhe ouvirem a voz, as primeiras flores rompiam a terra.
Então, quando ela chegava, era uma festa. Corria a Primavera de lés- a- lés e não havia ervinha, folha, haste, flor que não quisesse dançar com ela. Era uma enorme roda de alegria.
Mas a folgança não podia continuar sempre. Cansada do bailarico, a Primavera dava de bom grado o seu lugar ao Verão.
— Vamos trabalhar — dizia ele, assim que chegava.
E trabalhava-se, pois então! Os grãos e os frutos amadureciam. As flores arrecadavam tesouros. Nas tocas, nos ninhos, nos cortiços e por toda a parte, as palavras de ordem eram: trabalhar, colher, guardar.
Enquanto, nas praias, uns gozavam as férias, outros, no campo, não tinham descanso.
— O essencial fica feito. Deixo os retoques ao cuidado do meu irmão Outono — dizia o Verão, à despedida.
Lá vinha o Outono, com pincel e tintas apurar as cores. Achava sempre que merecia mais tempo. São tantas as tonalidades, do verde-escuro ao castanho, do laranja ao vermelho... Não se pode fazer obra asseada quando se sente os passos do Inverno a aproximarem-se. Que nervos!
Sorrindo no seu trono, o Sol acompanhava a obra dos seus quatro filhos. Descansa. Eles estão a dar muito boa conta de si.
E o Sol, risonho, ainda mais resplandece!...
 
António Torrado, "As Quatro Estações"
 
GOSTARAM??
 
BOA SEMANA!
:))
 
################################################### 

35 comentários:

  1. Gostei!
    ( Não conhecia)

    Abraço grande, grande

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Argos!

      Que bom poder dar-te a conhecer contos ou outro género de literatura, que não conheças!:) Partilhar, assim, é um prazer redobrado.

      Beijinho e abraço grande, grande!

      Eliminar
  2. Olá Janita, mas que história tão ternurenta e encantadora. Amei de verdade. Beijos com carinho

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Rosa-Branca!

      Na verdade, esta historinha, não deixa de ser uma ternura, apesar dos filhos continuarem à bulha! :)
      Obrigada, Amiga.

      Um beijinho com igual carinho.

      Eliminar
  3. Foram textos sem conta de António Torrado que estudei com os meus alunos! :)
    E bem precisamos de Sol!

    Abraço

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Imagino que sim, Rosa dos Ventos!

      Grande parte da vasta obra de António Torrado, é direcionada para a literatura pedagógica.

      De Sol, precisamos todos, Rosinha, o pior é que Sua Senhoria se anda a fazer esquivo.

      Um abraço:)

      Eliminar
  4. Janita, um texto lindo que não conhecia. Mais um Autor para 'vasculhar'. Viva o Sol, apesar da chuva de hoje...
    Um abraço,
    António

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, António.

      Uma boa oportunidade para 'vasculhar' a obra deste autor. Vai ver que não se arrepende!
      Eu dou Vivas a tudo, menos ao vento! Uma chuvinha também faz falta, não acha? :)
      Um beijo e um abraço.

      Eliminar
  5. Gostei imenso do que li, conheço muito pouco dos textos de António Torrado.

    Boa semana querida

    beijinho e uma flor

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, amiga Flor!

      Já publiquei, pelo menos, mais um texto de António Torrado e todos eles são deliciosos. Um grande escritor e dramaturgo, que gosta de escrever para crianças e adolescentes.

      Bom resto de semana, Querida Adélia.

      Beijinhos.

      Eliminar
  6. O António foi torrado pelo pai desses quatro filhos.. ;)

    Já sabes que comigo tinha que vir parvoíce...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Amigos, Daniel e Luciano, agora fizeram-me vir à memória, aqueles bons velhos tempos!!:))

      Qual parvoíce, Daniel! Isso é pensamento filosófico do mais engenhoso que há!:))

      Beijinhos para ambos.

      Eliminar
  7. Gostei do texto e estou a adorar estes dias de sol em Macau.
    Mas parece que se vai embora no final da semana :(
    Beijinhos

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sol, em Macau, Pedro??
      Isso é maravilhoso! Aproveitem bem, o que é bom, enquanto dura...

      Beijinhos!.

      Eliminar
  8. Um encanto, Janita. Se bem que os 4 filhos do astro-rei resolveram marcar presença em simultâneo ontem, 24-03-2014, aqui na Amadora. Fiquei com raiva deles todos. Ehehehehe. :)))))
    Beijinhos!!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Por acaso, já tinha pensado que ultimamente os quatro filhos se juntaram num gang e actuam todos ao mesmo tempo no mesmo dia... ;)

      Eliminar
    2. Luciano, se bem me lembro, houve um arco-íris fabuloso aí na Amadora, que deu origem à mais bela foto, no género, que eu já vi! E tirada no interior de um certo popó...:)) Mas isso aconteceu há 'séculos'!!:))

      Beijinhos!:))


      Daniel, se os 4 filhos deste Rei se juntaram e formaram um gang, vais ver há por detrás deles, oculto, um líder que talvez seja um certo 'Cereal Killer'! eheh :))))

      Um beijo e uma vénia, Sr. Realizador/Produtor/ Escritor das mais intrigantes e excepcionais curtas-metragens, da história da sétima arte. Ufa!
      ;)

      Eliminar
    3. Oh, Janita, fico sem palavras... ;)

      Eliminar
  9. Susana Miranda25 março, 2014 14:36

    Olá Janita,

    Uma linda história que não conhecia.
    Aqui pelo Porto a primavera entrou tristonha :( :(

    Beijinhos e um sorriso
    Susana

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Susanita! (isto é um diminutivo carinhoso, ok?)

      Se não conhecias, repito o mesmo que disse ao nosso amigo Argos!:)

      No Porto a Primavera entrou tristonha e cinzentona? Não me digas!!!:))

      Um beijinho grande. minha querida, hoje, apesar do frio intenso, já tivemos um dia de Sol!:)

      Janita

      :)

      Eliminar
  10. GOSTEI!!!

    E manda-me esse rei para Düsseldorf.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. AMEI, que tivesses gostado, Ematejoca!!

      Ok, quando ele aparecer por aqui em força, mando-o para Düsseldorf ter contigo!:)

      Um beijo!

      Eliminar

  11. ~ Textos ecantadores, muito bem escritos por um contista talentoso. ~

    ~ ~ ~ Beijinho e abraço. ~ ~ ~

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Majo!

      António Torrado é um dos escritores contemporâneos mais multifacetados, literariamente, falando!:) Adora escrever textos para a rapaziada!!

      Beijinho e abraço!

      Eliminar
  12. Olá, Janita!

    Eu gostei. Desta maneira cheia de imaginação e criatividade de descrever a sequência das quatro estações do ano.

    Beijinhos amigos, e que seja alegre a tua Primavera.
    Vitor

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Vitor!

      Imaginação e criatividade, são qualidades que não faltam a este talentoso escritor.
      Quase a brincar, ele descreve e ensina, as diferentes características de cada estação do ano.
      Que não te falte alegria em todas as estações, meu Amigo! Tu mereces!

      Beijinhos amigos.

      Eliminar
  13. Olá,

    vinha aqui deixar um abraço para ti ( outro para a Susana) e pensei que me tinha enganado de blog!
    :)

    Outro abraço grande

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Eheheh...Assustaste-te com o bebé, Argos? Repara bem onde ele está deitadinho...não te parece uma Angorá, branquinha e dengosa??:)

      O meu abraço já o agarrei com ambas as mãos!:))

      Beijinhos, muitos!

      ;)

      Eliminar
    2. Vou embora, faça o favor de devolver o abraço!
      :(

      Eliminar
    3. Quem dá e volta a tirar, ao Inferno vai parar...sabia???????????

      :))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))

      Eliminar
    4. Onde está o miúdo?!

      Abraço grande

      Eliminar
  14. Entrei mas logo saí.Não por susto mas com o receio de acordar o bebé (menino?) que tão sossegadamente dormia.
    Duvidei; porém confirmando o número da porta percebi ser onde queria entrar e, entrei.
    Mas fi-lo pé ante pé e depois de me descalçar (lavei os pés antes de vir), para não perturbar o sono da criança.
    Li atentamente as 4 estações do Sr. Torrado assim como estive deliciado a ouvir as do Signor Vivaldi (que adoro e me recordam outras estações).
    E pronto. Agradeço-te estes momentos deliciosos e vou saindo lentamente para não perturbar o menino (ou é menina? É que "daqui" não dá para ver...)

    Beijokas com sorrisos à mistura :))

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Kok!

      Sempre bem humorado! Assim é que devíamos ser todos. Rir - como dizes - é o melhor remédio. Não paga imposto, é contagiante e faz bem à saúde!
      Quanto ao bebé, como nunca lhe mudei a fralda, também não sei se é menino ou menina! Só sei que é lindo e gorduchinho. Apetece cobrir de beijos!:))
      E um beijo te mando agradecendo a tua sempre bem-vinda visita!
      Tenho de ir ver o que lá tens escrito acerca de Alves Redol.

      Sorrisos e risos, muitos! :)

      Eliminar
  15. Percorri as quatro estações com um sorriso nos lábios.
    Este conto de António Torrado é lindo.
    Gostei muito amiga Janita, obrigada por este belo momento.

    beijinho

    ResponderEliminar