quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

A Morte pela Solidão




Morrer é quando há um espaço a mais na mesa afastando as cadeiras para disfarçar, percebe-se o desconforto da ausência porque o quadro mais à esquerda e o aparador mais longe, sobretudo o quadro mais à esquerda e o buraco do primeiro prego, em que a moldura não se fixou, à vista, fala-se de maneira diferente esperando uma voz que não chega, come-se de maneira diferente, deixando uma porção na travessa de que ninguém se serve, os cotovelos vizinhos deixam de impedir os nossos e faz-nos falta que impeçam os nossos. 

António Lobo Antunes, in  “Não é Meia Noite Quem Quer”
 


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19 comentários:

  1. Não, não é mesmo meia noite quem quer

    Boa tarde Janita

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    1. Não, não é. Principalmente, quando se acorda a 'meio-da-noite' com um convite sussurrante, um chamamento aliciante; para o abismo.

      Boa noite, Noname!

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  2. Escritor, Psiquiatra, ou psiquiatra, escritor, são célebres muitas das suas citações avulsas !
    Uma das que me chamou ´atenção, de há muito foi esta : "É mais sensual uma mulher vestida do que uma mulher despida. A sensualidade é o intervalo entre a luva e o começo da manga."
    No meu tempo de adolescente não reparava muito no intervalo entre a manga e o começo da manga, mas sinceramente estava sempre atento à visão de um joelho ! :)
    Porque será que as mulheres hoje em dia se "descascam" tanto ?... rsrsrs ... Perderam a noção da sensualidade ?... rsrs

    Abraço, Janita ! :))

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    1. Um homem multifacetado, um escritor imprevisível. Irónico e com um sentido estético da escrita verdadeiramente invejável.
      Já me fez rir e emocionar.
      Claro que Lobo Antunes está carregado de razão acerca do conceito de sensualidade, Rui. A meu ver, está muito mais no que se insinua do que no que se mostra.
      Mas isso são outros quinhentos...:)

      Abraço, Rui! :)

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  3. Li esse romance - e outros de ALA - é muito bom! Bem deprimente, mas muito bem escrito!!! Gosto muito de o ler. Ainda não comprei o último sobre a memória, mas hei de comprá-lo...

    Beijinhos bem literários...

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    1. O Rui, ali em cima, está carregado de razão. Também concordo com ele!

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    2. Sabes, Graça? Muitas são as vezes em que me interrogo como pode um homem saber interpretar, tão fielmente, os sentimentos e as angustias da alma feminina. A dor da rejeição, da perda de uma parte do seu corpo, as recordações íntimas, a sede e fome de afecto e compreensão.

      (O Rui tem (quase) sempre razão!!!) ;)

      Beijinhos, sem dramas.

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  4. Dos escritores portugueses actuais que conheço, Lobo Antunes é o meu preferido. Não lhe assentaria mal um Nobel.

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    1. Inteiramente de acordo, quanto ao Nobel, José! Porque não?

      Não é o meu preferido, é um dos meus preferidos. :)

      Beijinhos.

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  5. Do António Lobo Antunes só tenho lido as crónicas.
    E gosto muito.
    Também estou de acordo com o Rui quanto à sensualidade.
    De partidas, neste momento não quero falar. Ainda estou a digerir a última.
    Um abraço

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    1. Também gosto dos poemas. A Elvira, não?

      Não falemos então de partidas, mas lembrar é uma forma de mantermos perto quem já está longe.

      Um abraço.

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  6. Querida Janitamiga

    Deixa-me ser iconoclasta e remar contra a maré: desde os nossos tempos (dele e meus) no Liceu Camões que não gosto do António Lobo Antunes (como pessoa e como escritor e um dia explicarei porquê se isso interessa a quem quer que seja...)

    Como diz a Elvirinhamiga gosto da maioria das crónicas que assina. E como diz o Ruiamigo ele diz coisas sensacionais mas parece-me que se cansa de as dizer. Este texto que tu, querida Janitamiga transcreves não é excelente, é excelentíssimo. O que não me impede de dizer que não gosto do António Lobo Antunes

    E ao contrário do que escreve o 500, o caso do Nobel é sintomático. Todo importante, arrogante, mal educado estava convencido que o prémio da Academia sueca lhe seria atribuído; Porém quando soube que fora o Saramago não fez qualquer declaração não o felicitou e... amuou.

    Se alguém entre a Literatura Portuguesa contemporânea merecia o Nobel era Miguel Torga.

    Peço-te desculpa, Janita, pela rudeza, mas como sabes, eu sou mesmo assim...

    Bjs da Raquel e qjs do Leãozão

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    1. Amigo Henrique.

      Tu lá terás as tuas razões para não gostar do escritor nem do homem, mas não carece explicação.

      Ora essa, Henrique, não há nada a desculpar. Cada um é como é e não se modifica só para gradar.
      O Miguel Torga também era tido como pessoa de trato difícil, mas quem ousa aventar a hipótese dele sequer não merecer o Nobel? Ninguém!

      Um abraço e obrigada pela tua opinião e visita, HenriquAmigo.

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  7. Gosto do ALA e da forma como constrói a sua narrativa. Não é fácil de ler (grande parte das pessoas desiste pois procura nos livros histórias "à maneira").
    Li os comentários que me precedem, nomeadamente o do Rui. Eu direi que a tendência que se tem instalado é de comprar tudo feito, tipo take-a-way. A velocidade dá cabo de tudo: clic!

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    1. Sempre uma honra receber a sua visita e comentários, Agostinho.

      Incisivo e pertinente, como eu gosto!

      Um beijinho e obrigada.

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  8. Os trabalhos de António Lobo Antunes são praticamente indiscutíveis.

    Beijinho, Janita.

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    1. Achas, António? Eu já digo que tudo pode e deve ser discutível.
      Porque nem todos agradam a todos, há sempre um ponto de vista diferente que nos escapa. :)

      Beijinho, Observador!

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  9. Querida amiga
    Aprecio muito as crónicas de António Lobo Antunes sempre intensas, emotivas e com um humor refinado.
    Neste excerto que publicaste, as palavras estão tão bem colocadas que tenho a sensação de estar a “ouvir” o meu próprio pensamento.

    A foto que escolheste está perfeita, pois Marilyn Monroe personifica a morte pela solidão .

    Um beijinho

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    1. Querida Fê.
      E, finalmente, alguém 'descobriu' porque escolhi a Diva, sempre rodeada de multidões e terrivelmente só...

      Um grande beijinho e bom fim de semana, Amiga.

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