segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

"A Senhora do Retrato."

Os retratos a óleo fascinam-me. E ao mesmo tempo assustam-me. Sempre tive medo que as pessoas saíssem das molduras e começassem a passear pela casa. Para falar verdade, estou convencido que isso aconteceu algumas vezes. Em certas noites, quando eu era pequeno, ouvia passos abafados e tinha a sensação de que a casa ficava subitamente cheia de presenças. Ainda hoje não gosto de atravessar os longos corredores das velhas casas com grandes retratos pendurados nas paredes. Há olhos que nos seguem do alto e nunca se sabe o que de repente pode acontecer.


Havia na casa da tia Hermengarda um quadro deslumbrante. Ficava ao cimo das escadas, à entrada do corredor que dava para os quartos de dormir. Mesmo assim, rodeado de sombras, irradiava uma luz que só podia vir de dentro da dama do retrato. Não sei se da blusa muito branca, se dos olhos, às vezes verdes, às vezes cinzentos. Não sei se do sorriso, às vezes alegre, às vezes triste. Eu parava muitas vezes em frente do retrato. Era talvez o único que não me assustava. Creio até que dele se desprendia uma luz benfazeja, que de certo modo me protegia.


Grã-Duquesa Marie Nikolaevna da Rússia, em 1914  ( * )





Mas havia um mistério. Ninguém me dizia quem era a senhora do retrato. Arminda, a criada velha, benzia-se quando passava diante do quadro. Às vezes fazia figas e estranhos sinais de esconjuração. A prima Luísa passava sem olhar.
- Essa pergunta não se faz - disse-me um dia em que lhe perguntei quem era aquela senhora.
Percebi que não gostava dela e que era um assunto proibido. Até a minha mãe me ralhou e me pediu para nunca mais fazer tal pergunta. Mas eu não resistia. Por vezes descaía-me e dava comigo a perguntar quem era a senhora dos olhos verdes, quase cinzentos, que me sorria de dentro do retrato.
Com a minha tia-avó, eu tinha uma relação especial. Ela lia-me histórias e poemas inquietantes. Creio que troçava das convenções, talvez das próprias pessoas. Por vezes era difícil saber quando estava a sério ou a brincar. Apesar de já ser muito velha, tinha um sentido agudo do ridículo. Foi a primeira pessoa verdadeiramente subversiva que conheci. Era óbvio que tinha um fraco por mim. Pelo menos era o único membro da família a quem ela tratava como um igual. Dormia no andar de baixo e nunca subia as escadas. Talvez por isso eu nunca lhe tinha perguntado quem era a senhora do retrato.

Um dia, farto já de tanto mistério e ralhete e, sobretudo, das gaifonas da Arminda e do ar empertigado da prima Luísa, não me contive e perguntei-lhe. A minha tia sorriu. Depois levantou-se, pegou no molho de chaves que trazia preso à cintura, abriu uma gaveta da escrevaninha e tirou um álbum muito antigo. Voltou a sentar-se e lentamente começou a mostrar-me as fotografias. Eram quase todas da senhora do retrato e do meu primo Bernardo, que há muito tinha partido para a África do Sul.
Apareciam juntos a cavalo e de bicicleta. E também de fato de banho, na praia da Costa Nova. Havia alguns em que o meu primo estava de smoking e ela de vestido de noite. Via-se também a tia Hermengarda, mais nova, por vezes os meus pais, gente que eu não conhecia. Até que chegámos à senhora do retrato já de branco vestido.
- Natacha - murmurou a minha tia, com uma névoa nos olhos.
E depois de um silêncio:
- Ela chama-se Natália, mas eu gosto mais de Natacha, sempre a tratei assim.
É preciso dizer que a tia Hermengarda tinha vivido em Moscovo no início da carreira diplomática do marido e era uma apaixonada dos autores russos, Pushkine, Dostoievski, principalmente Tolstoi, que visitou algumas vezes em Isnaia Poliana. Identificava-se com as personagens de Guerra e Paz. Creio que amava secretamente o príncipe André e gostava de ter sido Natacha. Falava muito da alma russa.
 Era uma propensão do seu espírito. 
- Tu também tens alma russa - dizia-me. E era como se me tivesse armado cavaleiro. 

Manuel Alegre, in “O Homem do País Azul,”  

 Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1989.


(*) A imagem foi escolha minha, retirei-a do Pinterest, mas não me foi possível trazer o link. Retirá-la-ei se alguém se intitular seu autor e for proibida a sua publicação. Obrigada.



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domingo, 25 de fevereiro de 2018

Reincidências...



Com que então caiu na asneira
De fazer na quinta-feira
Vinte e seis anos! Que tolo!
Ainda se os desfizesse…
Mas fazê-los não parece
De quem tem muito miolo!

Não sei quem foi que me disse
Que fez  a mesma tolice
Aqui o ano passado…
Agora o que vem, aposto,
Como lhe tomou o gosto,
Que faz o mesmo. Coitado!

Não faça tal; porque os anos
Que nos trazem? Desenganos
Que fazem a gente velho:
Faça outra coisa; que em suma
Não fazer coisa nenhuma,
Também lhe não aconselho.

Mas anos, não caia nessa!
Olhe que a gente começa
Às vezes por brincadeira,
Mas depois se se habitua,
Já não tem vontade sua,
E fá-los, queira ou não queira!

“Dia de Anos” Poema de João de Deus ‘in Campo de Flores’


Chegou antecipadamente, por ordem expressa de um Amor que vive longe.

Como também eu não tenho muito miolo, lá caí na asneira de voltar a fazer anos!!


Abençoada que sou, por possuir poucas, mas boas Amizades,
cá me chegou, enviado pela mão da doceira mais doce da blogo, este maravilhoso bolo de Aniversário.
Bem hajas, querida Nonane.

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Nota de final de dia:


Sortuda, eu, pois então, quem mais?...recebi este bolo e o belo ramo de flores de uma gentil Amiga.

A Elvira Carvalho!

Isto, há umas largas horas atrás, mas como passei o dia na boa-vai-ela, só agora me foi possível adicioná-las ao post.

Bem haja, querida Amiga! 




Também um grande Amigo, que trago no coração, pela sua bonomia, carinho e permanente boa disposição, haja o que houver, me ofertou estas bonitas flores, que têm tanto de simplicidade como de beleza e encanto.

Bem Hajas Amigo Kok!!

Uma grande beijoka. :)





A exemplo do ano passado, cá está o misterioso e simpático 
Mr.Google.



De cada vez que abro uma janela lá está ele:
"Feliz Aniversário Janita!"

Tal como já havia acontecido antes, à meia-noite, irá desaparecer, qual Cinderela!  E esta, hein??

O meu muito Obrigada a TODOS.

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sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

Porque Hoje é Sexta-Feira. # 1




Um brasileiro, do nordeste, casou com uma moça do Rio.
Na noite de núpcias, a mulher, excitada, perante a grandiosidade do que viu- digo eu- sussurra-lhe ao ouvido:
- Ai meu amor me agarra, me arranha, me bate com essa coisa que você tem aí em baixo para fazer chichi…
O nordestino, desorientado, sem perceber patavina daquela lengalenga, agarra no penico que estava debaixo da cama e…

…adivinhem o resto…Ehehehe











quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

"A Viagem, Enfim."

IMAGEM   DAQUI.




Isto de ter sempre o mesmo sonho todas as noites torna-se aborrecido.
Era assim: saía de casa, ia até ao carro e dizia à família: «Vamos lá fazer essa viagem».

Primeiro entravam a mulher e as duas crianças, depois os pais, ele instalava-se ao volante e pronto, não havia lugar para os sogros! Era sempre a mesma coisa. Por mais que empurrassem, não conseguiam metê-los lá dentro.
Acordava a suar, empurrando ainda qualquer coisa que não estava lá.
A mulher aconselhou-lhe uns calmantes, para ver se o sonho se ia.
Mas nada. Lá vinha sempre, todas as noites. 
É verdade que empurrava menos, talvez os calmantes, mas continuava naquele desespero de não conseguir enfiar os sogros no carro alucinante.
Os sogros disseram-lhe que não se interessavam em ir, não faziam questão, já estavam velhos para viagens.
Os pais prontificaram-se a ceder os lugares deles.
Toda a família colaborava, mas o sonho continuava.

Chegou a fazer experiências, a meter a família completa no velho Citroën arrastadeira. E conseguia, lá se metiam todos, mais ou menos apertados mas entravam. Mas no sonho não.
A coisa tornava-se desesperante.

- Porque é que não vais ao Mora? Ele é psicanalista, explica-te, tira-te isso  

- insistia a mulher, já arreliada, e preocupada também, com aquelas viagens nocturnas e frustradas em que ele se envolvia sem culpa.

O Mora era amigo de infância, nem sequer permitia que ele pagasse, era extraordinário! Às vezes até ia lá jantar. E respondeu à mulher:

- Tens razão, Xuxa, vou mesmo, que isto assim não pode ser. Tens sempre razão, menina.

Contou tudo. O Mora mandou-lhe contar mais, o passado continua sempre oculto, ao que disse. Deitado, contou-lhe o que ele precisava era de derivar, sabem, encontrar qualquer coisa além do carro e da viagem que não fazia em sonhos. Derivar. Substituir o carro.
Agradeceu e convidou o Mora para jantar no sábado. O Mora não podia e deu-lhe uma palmada nas costas.
Chegou a casa, aliviado, e esclareceu a Xuxa:

- Vou derivar, menina.
- Derivar?
- Sim, substituir o carro e tudo o mais, excepto tu, as crianças, os velhos e a casa.

(...)

À noite não sonhou. No dia seguinte a Xuxa disse-lhe que até parecia dez anos antes.
Tudo voltou à normalidade, os sogros deixaram de se preocupar com a viagem, as crianças entusiasmaram-se com os estoiros da moto. E o carro na garagem.
E, de repente, tornou a sonhar. O sonho.
Assim: saiu de casa, foi até ao carro e disse à família: «Vamos lá fazer essa viagem».

A mulher e as crianças entraram, depois os pais, e ele instalou-se ao volante. E não havia lugar  para os sogros! Começaram a empurrar para os meter lá dentro, e nada. Então virou-se para a garagem.
Estava um pouco diferente mas a moto continuava lá dentro. Deixou tudo, montou a moto, pôs o chapéu de palha e avançou pela estrada. Uma estrada larga, muito aberta a tudo. Pareceu-lhe já a ter visto alguma vez. Olhou para  trás e lá ao longe, à porta da casa, continuavam a empurrar-lhe os sogros. Acenou uma despedida, acelerou e continuou, olhando árvores e nuvens.
Ainda não voltou.


Mário-Henrique Leiria,  in “Contos do Gin-Tonic”


Nota: Para ficar a saber mais sobre Mário-Henrique Leiria,  e o que está ser feito para divulgar a obra deste fantástico escritor/poeta surrealista português, clique AQUI e AQUI. 




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segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Já Fui Feliz Aqui. [ XLII ]






Santuário de Fátima, treze de Maio de um qualquer ano da segunda metade do século passado já perdido nas brumas do tempo, mas não da memória. Tudo graças à magia fotográfica que perpetuou, em papel, certos pormenores que a memória já havia apagado.

Lamento que a reprodução destas fotografias, já esmaecidas pelo tempo, não tivesse sido feita através de digitalização, mas não se podem fazer omeletes sem ovos, não é? 

É com muito gosto que vou deixando, neste meu cantinho, alguns retalhos da minha vida.
Nada dura eternamente e um dia, também ele fechará o seu ciclo de vida.


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domingo, 18 de fevereiro de 2018

MÚSICA AO DOMINGO.


                                                                     

Acércate más, y más, y más
pero mucho más. 
Y bésame así, así, así 
como quieras tu. 

Pero besa pronto, 
 porque estoy sufriendo, 

no lo estás tú viendo 

que lo estoy queriendo 

sin quererlo tu. 

Acércate más, y más, y más, 
pero mucho más. 

Y bésame así, así, así
como quieras tu. 



Acaso pretendes 
a desesperarme 

ven por Dios a darme 

ese beso tuyo 

que te pido yo. 






Yo vendo unos ojos negros,
¿quién me los quiere comprar?

Los vendo por hechiceros,

porque me han pagado mal.


Más te quisiera,
más te amo yo
y toda la noche la paso
suspirando por tu amor!


Ojos negros traicioneros
Porque me miran así
Tan alegres para otros
Y tan tristes para mi



Más te quisiera,
más te amo yo
y toda la noche la paso
suspirando por tu amor!


Cada vez que tengo pena
voy a la orilla del mar

a preguntarle a las olas

si han visto a mi amor pasar.


Más te quisiera,
más te amo yo

y toda la noche la paso
suspirando por tu amor!





                                    

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quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

Amizades Geniais.





"Acreditava em tudo o que ela me dizia. Ficou-me gravada na mente a massa informe de don Achille a correr por passagens subterrâneas com os braços pendurados, segurando com os grandes dedos de uma mão a cabeça de Nu e com os da outra a cabeça de Tina. Sofri muito. Adoeci com febres pueris, melhorei, adoeci de novo. Fui atacada por uma espécie de disfunção táctil. Às vezes tinha a impressão de que, enquanto todos os seres animados em meu redor aceleravam os ritmos da sua vida…"

Este é o livro que pousou, mais recentemente, na minha mesa de cabeceira. E não está lá desde ontem nem de anteontem. Empanquei em algo que não me deixa avançar na leitura. Nem eu mesma sei qual a verdadeira razão. É um certo mal-estar que me invade sempre que penetro naquela dependência emocional de uma pessoa a outra. Pior - ou não -  tratando-se de crianças.Uma tão vulnerável e outra tão manipuladora. Há amizades que fazem mais mal do que bem. Quem se deixa influenciar nunca se apercebe disso. Pelo contrário, nutre uma verdadeira idolatração pelo outro.
Sou levada a crer que Elena Ferrante não ganhou mais uma leitora. Eu sei...eu sei, a culpa é minha. Não sendo uma pessoa influenciável e, quiçá, demasiado dona das minha convicções, custa-me muito aceitar que haja quem se deixe manipular a ponto de ter pesadelos... 

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quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Cinzas e Lume.



Quarta-feira de cinzas em Dia de Namorados
Este ano, aconteceu
Se em alguns corações há cinzas e tristeza
Para contrabalançar
Há corações de fogo em lume brando
Onde o feitiço e a magia
Ainda não pereceu.

Mas…disso, que percebo eu?





Nota: Esta imagem legendei-a há precisamente dois anos e podem revê-la AQUI.

Nota 2:  Ao comentar há pouco no blogue de uma amiga, falei numa canção sobre o "Estúpido Cupido", que dancei muito nos anos 60. Ora vejam lá se se lembram dela!!
Quem a cantava era a Celly Campello... :-)


                                                     



                                                





segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Não É Maldade, É Carnaval. :-)



Um negro tinha de ir a uma festa de Carnaval, pede então à mulher, uns dias antes, para lhe comprar uma fantasia.
Ao chegar a casa, à noite, vai ao quarto e vê uma fantasia de Super-Homem em cima da cama. 

Muito chateado, diz à mulher:

-  "Mas que porra dos fantasia é essa que tu arranjou? Tu já alguma vez viu Super-Homem preto? Tu vai trocar essas baderna já."

No outro dia, foi feita a troca por uma outra fantasia, desta vez de Batman.
À noite, há novamente gritaria:

- "Chiça, mulher, tu és burra!!! Tu já viu Batman preto??? Tu vai trocar essa porcaria outra vez." 

Na noite seguinte, quando o marido chega a casa, vai ao quarto e encontra três grandes botões brancos, um cinto branco e um pedaço de madeira comprido. O marido estranha e pergunta:

- "Mas que raio dos fantasia é essa?" 

A mulher, pacientemente, explica:

- "Tu tira os roupa, tu cola os botão nos frente do corpo e tu vai fantasiado de peça de dominó. Se tu não gosta, tu põe os cinto branco e vai vestido de bolacha Oreo! Se tu ainda não gosta, tu pega nos pau, tu enfia os pau no cu e tu vai mascarado de Magnum"  




BOM CARNAVAL

Para quem gostar de máscaras e para quem só gostar de ver. :-)

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Nota: Anedota e imagens da Net, claro!!

domingo, 11 de fevereiro de 2018

MÚSICA AO DOMINGO.



Alô, alô, marciano
Aqui quem fala é da Terra
Pra variar estamos em guerra
Você não imagina a loucura
O ser humano tá na maior fissura porque
Tá cada vez mais down the high society

Down, down, down/The high society
Down, down, down/The high society
Down, down, down/The high society
Down, down, down



Alô, alô, marciano
A crise tá virando zona
Cada um por si todo mundo na lona
E lá se foi a mordomia
Tem muito rei aí pedindo alforria porque
Tá cada vez mais down the high society

Down, down, down/The high society
Down, down, down/The high society
Down, down, down/The high society
Down, down, down





Alô, alô, marciano
A coisa tá ficando ruça
Muita patrulha, muita bagunça
O muro começou a pichar
Tem sempre um aiatolá pra atola, Alá
Tá cada vez mais down the high society

Down, down, down/The high society
Down, down, down/The high society
Down, down, down/The high society
Down, down, down

Alô, alô, marciano
Aqui quem fala é da Terra
Pra variar estamos em guerra
Você não imagina a loucura
O ser humano tá na maior fissura porque
Tá cada vez mais down the high society
Ui, gente fina é outra coisa, entende?

Down, down, down/High society
Down, down, down, down, down
High society

Hoje não se fazem mais countries como antigamente, não é?
High society, high society, high society, high society
Down, down, down/High society
Down, down, down,/High society

Ai que chique é o jazz, meu Deus

Down, down, down
High society
Down, down, down

Ah, Deus.



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