O rio Douro corre quase sempre
num leito apertado em altas montanhas, como se tivesse aberto caminho
apressadamente, rompendo todos os obstáculos. Mesmo junto à cidade do Porto
passa em rápida corrente, ansioso por chegar à foz.
O Tejo, ao entrar em Portugal,
parece retardar a marcha para contemplar as campinas que lhe bordam as margens.
Em frente da cidade de Lisboa, espraia-se à vontade, e é difícil distinguir
onde acaba o rio e começa o mar.
O Guadiana, em quase todo o percurso, desliza entre aprazíveis
campos, tranquilamente. Ao chegar a Vila Real de Santo António, parece que
parou a contemplar maravilhas, e é o Oceano que o vem ali buscar.
Estas diferenças entre os três
rios inspiraram ao nosso povo uma graciosa lenda.
~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~
Lá quase da outra banda da
Espanha, nasceram três irmãos em serranias agrestes. Mal abriram os olhos para
o céu, viram passar as nuvens e perguntaram-lhes de onde vinham.
- Vimos do mar, que é nosso
pai e vosso avô— responderam elas.
-- E é lindo o mar?
-- Tão lindo que, de dia tem a
cor do céu, e, de noite, parece ter ainda mais estrelas do que o firmamento
-- E é grande?
-- Tamanho que todos os rios a
correr nunca o enchem, e todas as nuvens a beber-lhe a água não o esgotam
nunca.
-- Havemos de ir ver o mar…
Combinaram os três que, na
manhã seguinte, abalariam a caminho do Atlântico.
O Guadiana mal dormiu durante a
noite, a sonhar com o avô. E, madrugador, apenas o sol doirou o cimo da sua montanha,
esfregou os olhos e começou a caminhada. Como tinha tempo foi escolhendo os
caminhos mais belos e deleitosos. Dizia consigo: -- Vamos vendo, e o mar que
espere!
O Tejo acorda depois, e dá pela
falta de um dos irmãos. Põe-se a correr veloz, para não chegar tarde, e quase
não escolhe caminho. Mas, ao entrar em Portugal, pensa lá consigo que já deve
ter muito avanço, e, então, lembra-se de gozar as campinas e até de se
espreguiçar por largas margens, antes de se lançar nos braços do avô.
O Douro, esse, deixou-se
adormecer. Já o Sol ia alto, quando acordou estremunhado e se viu só. Nem
esfregou os olhos: Ele aí vai por montes e vales, furando por desfiladeiros,
saltando por penedias, de precipício em precipício, na ânsia de chegar. Nem
quer saber das belezas que dos cimos espreitam.
E, assim, foi ele quem, sujo e
enlameado, chegou primeiro.
Nota: Texto transcrito deste livro, que tive a sorte de reencontrar, à venda numa estação dos CTT, numa edição recente de alguns dos meus livros de leitura do ensino primário. Um tesouro inestimável!
Tenho a certeza que muitos de vós também se lembram destas preciosas lições, em prosa e em verso...