Visitei, um dia destes, uma Exposição de pintura em Lisboa, de trabalhos realizados pelos alunos de uma Escola de Arte que um familiar meu frequenta e fiquei totalmente deslumbrada.
Aos meus olhos de leiga, qualquer esboço ou uma simples cena campestre já é uma obra de arte.
Mas não era o caso. Ali havia talento; que a aprendizagem da técnica, sob a orientação de um óptimo Mestre, aprimorou. Segundo ele, modestamente nos disse, algumas alunas já o haviam suplantado em sensibilidade, engenho e arte. Acho que foi só mesmo modéstia, apesar de eu as ver sorrir muito!
Este "Nu" é da autoria da aluna Isabel Guerreiro. Que lhes parece?
Ainda alimento a esperança de um dia ir viver para perto da capital e fazer, então, o inverso do que faço agora. Aí, virei visitar o meu querido Porto, de vez em quando!
* * * * * * * * * * * * * *
"Como Eu não Possuo"
Olho em volta de mim. Todos possuem
Um afecto, um sorriso ou um abraço.
Só para mim as ânsias se diluem
E não possuo, mesmo quando enlaço.
Roça por mim, em longe, a teoria
Dos espasmos golfados ruivamente;
São êxtases da cor que eu fremiria,
Mas a minh'alma pára e não os sente!
Quero sentir. Não sei... perco-me todo...
Não posso afeiçoar-me nem ser eu:
Falta-me egoísmo para ascender ao céu,
Falta-me unção para me afundar no lodo.
Não sou amigo de ninguém. Para o ser
Forçoso me era antes possuir
Quem eu estimasse - ou homem ou mulher,
E eu não logro nunca possuir!...
Castrado de alma e sem saber fixar-me,
Tarde a tarde na minha dor me afundo...
Serei um emigrado doutro mundo
Que nem na minha dor posso encontrar-me?...
* * * * *
Como eu desejo a que ali vai na rua,
Tão ágil, tão agreste, tão de amor...
Como eu quisera emaranhá-la nua,
Bebê-la em espasmos d'harmonia e cor!...
Desejo errado... Se a tivera um dia,
Toda sem véus, a carne estilizada
Sob o meu corpo arfando transbordada,
Nem mesmo assim - ó ânsia! - eu a teria...
Eu vibraria só agonizante
Sobre o seu corpo de êxtases dourados,
Se fosse aqueles seios transtornados,
Se fosse aquele sexo aglutinante...
De embate ao meu amor todo me ruo,
E vejo-me em destroço até vencendo:
É que eu teria só, sentindo e sendo
Aquilo que estrebucho e não possuo.
Mário de Sá-Carneiro, in "Dispersão".
Um afecto, um sorriso ou um abraço.
Só para mim as ânsias se diluem
E não possuo, mesmo quando enlaço.
Roça por mim, em longe, a teoria
Dos espasmos golfados ruivamente;
São êxtases da cor que eu fremiria,
Mas a minh'alma pára e não os sente!
Quero sentir. Não sei... perco-me todo...
Não posso afeiçoar-me nem ser eu:
Falta-me egoísmo para ascender ao céu,
Falta-me unção para me afundar no lodo.
Não sou amigo de ninguém. Para o ser
Forçoso me era antes possuir
Quem eu estimasse - ou homem ou mulher,
E eu não logro nunca possuir!...
Castrado de alma e sem saber fixar-me,
Tarde a tarde na minha dor me afundo...
Serei um emigrado doutro mundo
Que nem na minha dor posso encontrar-me?...
* * * * *
Como eu desejo a que ali vai na rua,
Tão ágil, tão agreste, tão de amor...
Como eu quisera emaranhá-la nua,
Bebê-la em espasmos d'harmonia e cor!...
Desejo errado... Se a tivera um dia,
Toda sem véus, a carne estilizada
Sob o meu corpo arfando transbordada,
Nem mesmo assim - ó ânsia! - eu a teria...
Eu vibraria só agonizante
Sobre o seu corpo de êxtases dourados,
Se fosse aqueles seios transtornados,
Se fosse aquele sexo aglutinante...
De embate ao meu amor todo me ruo,
E vejo-me em destroço até vencendo:
É que eu teria só, sentindo e sendo
Aquilo que estrebucho e não possuo.
Mário de Sá-Carneiro, in "Dispersão".
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Estos aprendices en realidad muchos son verdaderos maestros poniendo en sus obras el alma y el corzon pero sus obras nunca están reconocidas,y lo pero es que esas obras se vendan en mercados.
ResponderEliminarGran y sentida entrada.
Saludos
Comento o nu, num corpo incomodamente instalado e um olhar quase horrorizado, com palavras do poema:
ResponderEliminar"Tarde a tarde na minha dor me afundo...
Serei um (ser) emigrado doutro mundo
Que nem na minha dor posso encontrar-me?..."
Eu também diria que essa aluna é uma verdadeira MESTRA na sua arte. ;)
ResponderEliminarBeijinhos, Janita.
Está muito bem desenhado, Janita, e expressivo! Boa aluna
ResponderEliminarQuem sabe se não será um nome a fixar?
ResponderEliminarAgora que regressaste, parto eu, mas o Rochedo continua a navegar, claro.
Beijo
Pois eu também sou um leigo na matéria. Aliás, tenho a impressão que somos um pouco um país de leigos, salvo raras excepções. Não somos educados e o gosto também se educa. Não somos educados para as artes e adquirimos o hábito de opinar sobre tudo, sem saber.
ResponderEliminarEu aprecio do mesmo modo uma pintura ou um vinho:
Se me souber bem, é bom, independentemente de estar a dizer um disparate. xD
Querida amiga,
ResponderEliminarnão sou critico de arte, logo, não sou a pessoa mais indicada para criticar qualquer que seja o quadro.
Passei para dar-lhe um beijinho/abracinho e desejar-lhe um bom feriado.
Olá, Janita!
ResponderEliminarOpinar sobre arte não é tarefa fácil, já que em si mesma arte é algo tão difícil de definir - tão vasta.É coisa diversa para pessoas diferentes, ainda que o objecto apreciado seja o mesmo.
Quanto ao quadro, acho que tem mérito,agradável à vista - opinião baseada no meu gosto e percepção do mérito do trabalho feito.
Poema tristinho que escolheste; deste homem que se sente incapaz de amar ou sentir amado. Triste sina a dele; muito bem escrito o poema.
Beijinhos; bom feriado - com ou sem ponte ...
Vitor
Gosto muito desse quadro de um nu artístico!
ResponderEliminarGosto do nu velado, não o explícito.
Gosto do nu que deixa um campo livre à imaginação para se poder estender...
Beijinhos
Caramba, quem me dera a mim saber pintar assim. Ou melhor, saber pintar!
ResponderEliminarBom feriado!
Gostei, das formas, das cores...
ResponderEliminarE ADOREI o poema!!!
Belíssimo!!!
Bj
Boa noite amiga Janita, venho agradecer a sua amável visita.
ResponderEliminarQuanto ao quadro não sou perito da arte.
Todavia posso dizer que gostei, e quem o pintou sabe o que faz.
O "Tintinaine", não é alentejano, ele
é seu vizinho, reside na Povoa de Varzim. É um bom amigo.
Desejo uma noite muito feliz para você, um abraço.
Eduardo.
Olá Janita!
ResponderEliminarPodes então vir viver para Lisboa, mas olha que aqui é mais fácil chegar à depressão. E como andas a ler Mário Sá Carneiro, chegas lá rapidamente.
Quanto à arte, já disseste tudo.
Beijinho
Minha querida Janita
ResponderEliminarÉ realmente uma obra de arte esse nu e o poema de Mário de Sá Carneiro é maravilhoso, adorei e deixo um beijinho com carinho.
Sonhadora
Eu também não sou crítico de arte, mas gosto de ver um bom quadro em qualquer parte.
ResponderEliminarE neste quadro encontrei um pequeno pormenor, coisa pouca quase nada, é que a moça tem a perna levantada, e não deixa ver mais nada.
O poema Do Mário Sá Carneiro, aqui não tenho nenhum reparo, porque não consigo lá chegar.
Bom fim de semana,
Beijinho.
José.
Parabéns à Isabel Guerreiro pelo quadro muito bonito e muito bem executado, parabéns por si por fazer a divulgação (não faria mal ter dito o nome da escola de arte) e uma palavra especial para Mário de Sá-Carneiro de quem sou um incondicional fã da sua pequena mas tão rica obra. A vida é efémera mas a memória pode ser eterna.
ResponderEliminar"De embate ao meu amor todo me ruo"
Janita Amiga,
ResponderEliminarArte e poesia são os temas aqui privilegiados. A arte é o corpo, a poesia é a alma. Sómente o corpo com alma poderá estar vivo.
Bj amigo,
J
É bom compartilhar estas pequenas, grandes coisas, que se nos deparam no quotidiano.
ResponderEliminarOs alunos suplantarem o mestre é, também, muito normal.
Bom fim de semana.
Janitamiga
ResponderEliminarDeambulando pela blogosfera, coisa que se me vai tornando cada vez mais natural (e essencial) tenho vindo a encontrar-te frequentes vezes e até creio que já nos cruzámos. Por isso, vim hoje aqui, já te sigo comento.
Sei alguma coisita de artes plásticas e gráficas e a tela parece-me boa. Um tanto recatada e... púdica. A Isabel Guerreiro se for continuar neste trilho chegará longe. Onde? Não sei.
As cores estão bem doseadas, a figura expressiva, os contrastes são bem feitos; enfim, está realmente bom. Tem que se lhe dar os parabéns - e acompanhá-la com atenção.
Já o poema do Mário de Sá-Carneiro é excelentemente escolhido porque é, como não dia deixar de ser,... excelente. É um dos Grandes, e, por vezes tem sido um tanto descurado. O que não pode ser - e felizmente não é. Ele e Pessoa marcaram uma época.
Pois então, deixa-me que te diga: tens um belo blogue. E basta de palavreados. Tens mesmo. Parabéns e obrigado pelo que me (nos) proporcionas.
Conto contigo na minha Travessa. Amor com amor se paga...
Qjs = queijinhos = beijinhos
♥✿⊱╮
ResponderEliminarº°♥❤ Olá, amiga!
❤ Passei para uma visitinha.
Gostei da leveza da tela e da intensidade da poesia.
Bom fim de semana!
Beijinhos.
Brasil ♥✿⊱╮
º°♥❤ ❤
HOLA JANITA: QUE GUSTO PODER COMPARTIR ESA IDA AL MUSEO Y ENCONTRARSE CON TANTAS HERMOSAS OBRAS.-
ResponderEliminarEL POEMA ES EXTRAORDINARIO...MUY FUERTE...MUY BELLO...
en lo que te refieres en mi anterior blog donde te decía " estoy de reforma", pues casi adivinaste, pues aquí, se le dice cuando estas arreglando una casa, pero tu, también tienes razón...estoy en tramite de jubilación..."
MUCHOS BESOS.-
UAU AMIGA JANITA!!!
ResponderEliminarAdoro pinturas de nus, que são mesmo muito difíceis de pintar,já fiz algumas tentativas e sei do que estou a falar :)
Esta "nua" é muito expressiva!
Espero que venhas depressa cá para baixo, estou à tua espera!
O poema é intenso como são todos os poemas de Mário de Sá-Carneiro.
beijinhos e bom fim de semana