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Da Net. A mais parecida que encontrei,com a que o escritor
publicou para ilustrar a sua Crónica. |
Juntar as pontas dos ombros e dar algumas
palmadinhas nas costas não é um abraço.
Escrever «abraço» no fim de um e-mail também não é um abraço.
Indiferente ao desenvolvimento social e
tecnológico, um abraço continua a ser duas pessoas que se juntam e se apertam
uma de encontro à outra.
Não são os abraços que provocam as
ligações, são as ligações que provocam os abraços.
Um abraço tem muita importância.
Quando eu era uma criança, teria talvez uns
nove ou dez anos, o meu pai deu-me um abraço na cozinha da nossa casa. Era de
madrugada porque essa era a hora em que, naquele tempo, se saía da minha terra
quando se ia para Lisboa.
O meu pai tinha uma operação marcada no
hospital, estava vestido com as roupas novas e tinha medo. Enquanto me abraçava
o meu pai chorou porque, durante um momento, acreditou que podia nunca mais me
ver.
Os braços do meu pai passavam-me pelos
ombros, a minha cabeça assentava-lha na barriga, sobre o pullover. A lâmpada que tínhamos acesa por cima da cabeça espalhava
uma luz que amarelecia tudo o que tocava.
O meu pai usava um aftershave muito enjoativo, barato, que alguém lhe tinha oferecido
no Natal. Agora mesmo, consigo ainda sentir esse cheiro com nitidez absoluta.
A operação correu bem. Depois do susto,
depois da convalescença, o meu pai voltou para casa com uma cicatriz grossa e
roxa na barriga. Depois disso, tivemos direito a nove anos em que não voltámos
a pensar em despedidas.
Durante muito tempo procurei em toda a
minha memória, as lembranças de quando voltou da operação ou, depois, quando tínhamos
a mesma altura ou, mesmo depois, quando ficou doente pela última vez. Mas
abandonei as buscas, não consigo recordar outra ocasião em que nos tenhamos
voltado a abraçar.
Essa madrugada na cozinha, a luz amarela, o
aftershave, foi a única vez em que
nos abraçámos na vida.
Não afirmo com leveza que um abraço tem
muita importância. Há quinze anos que escrevo livros apenas sobre esse abraço.
Crónica de
estreia do escritor, José Luís Peixoto na Notícias Magazine, revista semanal do JN, publicada hoje, sob
o título:
“O que dizem os abraços”
Nota: O principal motivo que me levou a partilhar convosco esta Crónica, para além de saber vir muito a propósito sobre a facilidade com que distribuímos abraços, foi ter-me lembrado da opinião de um Amigo que nunca se despede de mim - e creio que de outros amigos também - com um beijo ou um abraço.
Penso que se recusará a vulgarizar uma manifestação de afecto, que apenas se sente ao vivo e, somente, com quem temos uma forte ligação afectiva. Mas isso já sou eu a conjecturar...
Não vou dizer de quem se trata, mas sei que ele - se acaso me vier ler - saberá de quem falo! Verdade? J