A
monotonia destes meus dias, sempre iguais, começaram a pesar-me como um fardo.
Eu vou tentando variar as minhas actividades quotidianas, e até o percurso das
minhas caminhadas lhes tenho invertido o sentido de ida e volta.
Alterno
a superfície comercial onde efectuo as compras de bens alimentares. Numas
ocasiões faço-as no mini mercado a poucos metros de minha casa e, noutras, vou
a um de nome sobejamente conhecido e não quero publicitar. Ainda assim, entre
ida e vinda não faço mais do que meia-dúzia de kms.
Já
semeei salsa, transplantei plantas para vasos maiores, arranquei ervas daninhas do quintal, as viscôdeas
ou lá como chamam, por aqui, às ervas de
folha carnuda e arredondada que mais parecem repolhos, e teimam em encher o
relvado.
Já
ressuscitei livros que jamais pensei reler. Enfim, tenho feito trinta por uma
linha. Canso o corpo para descansar a mente, não obstante o meu esforço, sinto a
mente e o corpo a recusarem sossego. Vivo, sem saber porquê, num desassossego
permanente. Nada que pense sobre hipotéticas alegrias, me alegra. Nada anseio e
nada desejo. Até o sono me abandonou.
Contra
todas as expectativas, sobre o voltar a ter liberdade de ir e vir, voltar ao
salão de estética, alindar um pouco o que já não dá para alindar, mas sempre seria
uma refrescada nesta aparência deprimente, me entusiasma. Será isto o fim? A
velhice a tomar conta do espírito, que sempre se recusou acompanhar a do corpo? – Não sei. Não sei mesmo.
O que sei
é que quando hoje ouvi o arauto
proclamar a ligeira abertura do confinamento, concedendo-nos a benesse de
voltarmos a ser viventes do século XXI, fiquei impávida e serena. Não tugi nem
mugi. Não me aquentou nem arrefentou. Acho que aquela frase já batida de se
nadar desesperadamente para acabar vindo morrer na praia, tomou forma em mim.
Que não
venha a correr nenhum nadador-salvador, fazer-me respiração boca-a-boca,
tentando reanimar-me. O meu corpo recusa ser oxigenado, adaptou-se à apatia amorfa
dos dias e anos perdidos e só anseia por dez horas de um bom sono reparador, de
preferência sem sonhos.
Só depois verei, se o mundo mudou ou se fui eu que
mudei...
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