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Como o dia estivesse muito quenteas mulheres saíram de casa e foram à sua vidacom blusas sem mangas.A carne dos seus braçoserguidos ao alto para alcançarem as argolas do autocarroeram veios de luz voluptuosa e cálida.Apelo de escultorque esculpe trauteando melodias.Iam todas afogueadas de calor,de calor feminino,e por isso eram largas as cavas das suas blusase delas emergiam os braços levantadospara alcançarem no alto as argolas do autocarro.Era com aqueles braços nus,desprendidos das argolas do autocarro,que aquelas mulheres na hora permitida,cingiam e apertavamos corpos horizontais dos seus companheiros.Mas não era nisso que elas iam a pensar.Elas iam a pensar no seu trabalho quotidiano,no ir e vir,no andar a correr,no cozinhar,nas compras,no emprego,no dinheiro que não chega,e pensavam, com os olhos parados e distantes,enquanto se agarravam às argolas do autocarro, noutra vida melhor,sem ir e vir,sem andar a correr,sem horas para isto e para aquilo,livres,livres,livres e independentes,para então cingirem e apertarem nos seus braços nusos corpos horizontais dos seus companheiros.
António Gedeão, in "Novos Poemas Póstumos"
O Carlos deixou-nos muito cedo e muito depressa.
ResponderEliminarEle, o Rui, a Teté.
Beijinhos, boa semana
Três espaços que ficaram irremediavelmente vazios e deixaram a blogosfera mais pobre.
EliminarCom a sua alegria e o dinamismo que imprimiam aos seus passatempos, mobilizavam todo o nosso blogobairro.
Nunca mais nada foi como era.
Hoje sinto-me terrivelmente deprimida e triste. Para além da minha ida ao HSJ, serviço de hematologia oncológica, e vir de lá sempre de rastos, foi a sepultar uma jovem que eu conhecia bem. Em poucos meses, a doença maldita, que não perdoa, começou a devorar-lhe os ossos. Uma esposa e mãe, ainda tão jovem, tão linda e com tanto caminho à sua frente... :(
Beijinhos e boa semana, Pedro.
Penso neles com tanta frequência!! Animavam a blogosfera, cada um à sua maneira. : )
EliminarÉ verdade, Catarina. Cada um à sua maneira formavam um todo que se completava e nos ligava uns aos outros.
EliminarO Rui, com a sua bonomia, generosidade, carinho - sempre te tratava por Catá e a mim por Jani - e espírito apaziguador, fazia-nos pensar com os seus Desafios.
A Teté, no seu comedimento, estava sempre predisposta a desafiar-nos a entrar na sua onda, com as mais variadas propostas fotográficas. E o Carlos...bem, o Carlos era o Carlos! Inquieto, polémico, nas suas opiniões políticas e clubísticas, amigo do seu amigo e um grande narrador das próprias histórias de vida. Muitas delas, ainda hoje me interrogo se seriam fictícias ou reais, ou um misto das duas coisas. Lembras-te daquela crónica sobre a empregada dos pais que se chamava "Prantelhana"? Uma delícia de narrativa.
Saudade...
Beijos, Catá. :)
Grande Gedeão, nada melhor que o calor para que os braços nus das mulheres se mostrem...
ResponderEliminarO postal é magnífico.
Boa semana, amiga Janita.
Um beijo.
O calor também não ajuda nada a quem tem de correr para os transportes públicos...actualmente, até acontece com frequência a correria não levar a nada, se houver greve, ou vão a pé ou regressam ainda mais cansadas.
EliminarO postal retrata um Bar nas primeiras décadas do século passado.
Um beijo e boa semana, amigo Jaime.
Belo postal. Lindo registo poético
ResponderEliminarUm dia feliz
Que venham dias felizes, caro Rycardo.
EliminarA Humanidade agradece.
Obrigada pela visita.
Bom dia
ResponderEliminarSó me ocorreu um adjetivo.
LINDO !!
JR
Gostei do adjectivo que lhe ocorreu, Joaquim.
EliminarA visualização da situação que o Poeta recria, faz-nos pensar.
Boa noite e obrigada.
Com esta publicação fizeste-me recordar as 'Crónicas do Rochedo' de tão boa memória.
ResponderEliminarQuanto a Gedeão, não há muito por dizer.
Beijinho, Janita, boa semana.
Lembro-me muitas vezes das Crónicas do CBO, as do Rochedo e as On the Rocks.
EliminarHá tanto, mas tanto para dizer de António Gedeão...
Beijinhos e boa semana, António
Que interessante publicação :))
ResponderEliminar.
Beijo, e uma excelente semana.
Uma opinião que não contrariarei, penso o mesmo.
EliminarUm abraço e uma óptima semana, Cidália.
Não conhecia este poema... Nada de novo!! : )
ResponderEliminarGostei. Assim como gosto muito da foto de cabeçalho que já tinha visto, mas que me tinha esquecido de mencionar.
Lamento o que aconteceu a essa amiga que conhecias.
Que tenhas muitos dias leves e bem dispostos, Janita...
Bjos
A foto de cabeçalho foi-me oferecida pelo Kok no dia do meu aniversário. Outro grande amigo a quem a vida também não tem protegido como ele merece.
EliminarHoje já me sinto mais conformada. Se nada acontece por acaso, esperemos que os dias piores sirvam para nos mostrar que ainda há muito a esperar de bom, nos dias vindouros.
Obrigaada e um grande, grande abraço, querida Catarina.
Querida Janita, já retornando, apenas uns poucos dias.
ResponderEliminarQue tema excelente o de hoje, mulheres nos ônibus, muitas em pé pela lotação esgotada, quase dependuradas nas argolas, apertadas, desconfortáveis, cansadas e com a mente longe!
Adoro António Gedeão, tenho alguns de seus poemas em meu blog, inclusive um musicado, belíssimo.
Gostei muito da postagem, amiga.
Um beijinho e uma feliz semana.
Olá, querida Tais. Fico feliz por revê-la por aqui.
EliminarAntónio Gedeão dedicou muitos dos seus poemas à Mulher portuguesa e às suas vicissitudes e canseiras, sobretudo no tempo do Estado Novo, onde a supremacia do homem fazia com a mulher, menos favorecida pela sorte, nunca fosse muito mais do que um objecto ao seu dispôr.
Nenhum outro poema foi tão explícito nesse aspecto, quanto o foi a 'Luísa' da "Calçada de Carriche".
(...)
Saiu de casa
de madrugada;
regressa a casa
é noite fechada.
Na mão grosseira,
de pele queimada,
leva a lancheira
desengonçada.
Anda, Luísa,
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.
Luísa é nova,
desenxovalhada,
tem perna gorda,
bem torneada.
Ferve-lhe o sangue
de afogueada;
saltam-lhe os peitos
na caminhada.
Anda, Luísa.
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.
(...)
Com a luta pela igualdade de direitos, as coisas melhoraram, mas ainda estão longe de estarem totalmente resolvidas. Sobretudo a nível de profissiões. Enfim...
Beijinhos e tudo de bom, amiga Tais.
Que pertinência! Acurado olhar! Precisão de linguagem! Gosto da repetição de vocábulos e dos processos de linguagem. E da poesia de António Gedeão/ Rômulo de Carvalho. E do ritmo do poema, e da obra de arte que resultou desse processo,, que são os braços dessas mulheres. E gosto do que há neles de espasmódicos, e da analogia que se possa fazer com o erótico, com o movimento desses corpos em movimento no movimento dos autocarros, e dessa escrita que me parece um ato de amor pela escrita e na escrita.
ResponderEliminarBeijinhos, minha amiga!
É verdade, amigo JC! O Professor Rómulo de Carvalho, adoptou o pseudónimo de António Gedeão e foi autor de muita poesia que pôs a nu o quotidiano da maioria das mulheres portuguesas durante, e até após, as trevas do Regime ditatorial.
EliminarE eu, gosto do gosto que o meu amigo colocou na sua análise deste poema. Nada como as palavras sabedoras de quem sabe destrinçar tudo o que fica nas entrelinhas, sejam de prosa ou sejam poesia.
Sim, quem ama a escrita, quando escreve, é como se praticasse um acto de amor. Concordo inteiramente.
Beijinhos com gratidão e afecto.
Belo postal desses braços nus que se estendem para o o mundo.
ResponderEliminarMuito bonito o poema de António Gedeão, gostei muito.
Beijinhos amiga Janita
Fico tão contente com a tua satisfação, perante este belo poema do nosso grande Poeta A. Gedeâo, amiga Manu!!
EliminarUm beijinho grande e grato.
E eu a pensar que conhecia bem a obra de António Gedeão!
ResponderEliminarAbraço
:) Pois...há sempre algo por descobrir no mundo da Poesia, querida Leo.
EliminarÉ esse o lado bom da interacção virtual e blogueira.
Grande abraço.
Adoro este poema e sempre que o leio fico a pensar na grande verdade que me transmite.
ResponderEliminarA foto está o máximo!
Beijos e um bom dia
No tempo em que me deslocava em transportes públicos para ir trabalhar, tinha sempre lugar sentada no autocarro que me levava de Moscavide até à rotunda de Cabo Ruivo. Quem me dera voltar a esse tempo, difícil, mas esperançoso.
EliminarBeijinhos, Fatyly.