Vá-se lá saber porquê - ou melhor, eu sei - quando as ruas começam a ficar profusamente iluminadas, com as luzes ornamentais natalícias, quando as palavras Humanidade e Fraternidade, atingem uma maior dimensão e tudo e todos à nossa volta nos parecem mais predispostos a esquecer animosidades e o mundo se enche, subitamente, de um espírito de boa-vontade e entreajuda, lembro-me de Guerra Junqueiro e do livro:
A Velhice Do Padre Eterno.
Cá por coisas minhas...(*)
As crianças têm medo à noite, às horas mortas,
Do papão que as espera, hediondo, atrás das portas,
Para as levar no bolso ou num capuz dum frade.
Não te rias da infância, ó velha humanidade,
Que tu também tens medo ao bárbaro papão,
Que ruge pela boca enorme do trovão,
Que abençoa os punhais sangrentos dos tiranos,
Um papão que não faz a barba há seis mil anos,
E que mora, segundo os bonzos têm escrito,
Lá em cima, detrás da porta do infinito!
(*)...Que não vou dizer.
Como é, a Janita leu esse livro proibido?
ResponderEliminarQuanto ao Natal: somos todos muito bonzinhos, amigos dos pobres, dos familiares e de tuti quanti. Chegados ao dia 26 esquecemos tudo, menos o nosso umbigo.
Este e mais dez que fazem parte de uma colecção que comprei há muito tempo, José. Editados pela Lêllo & Irmão, aqui do 'seu' Porto.
EliminarEle, o escritor, malhava nos padres e na hipocrisia que reinava na Igreja. Por isso acusaram-no de ateu. Aqui ele desmistifica muita coisa. Não chegou a ler o poema:
" O Melro"?
Um dia destes levo-lhe o link de uma publicação minha, lá à sua Zorra. :)
Grande verdade essa. Tudo cheio de encanto, de amor solidário e fraterno, mas é tudo fogo de artifício, apenas dura o período do Natal aos Reis.
Um beijinho e boa semana. :)
Desculpa ocupar tanto espaço, mas acho que vem a propósito, um soneto do meu pai (de 1928) sobre o tema :
ResponderEliminarTRISTE (A Minha Mãe)
Fim de dia, sol poente, oh, que tristeza !
Foge o sol a esconder-se muito além
Entre as serras, que são a fortaleza
Que de mais forte a natureza tem.
Na minha alma, tão cheia de tristeza,
É quase noite, o sol foge também !
Errante, caminhando na incerteza,
Procuro gentes,... não vejo ninguém !
E tenho medo dessa escuridão
Como tinha receio do papão
Que chamavam, quando eu era menino...
Ó minha Mãe, manda o papão embora!
- Eu tenho medo de sentir agora
O medo que sentia em pequenino !...
.
Puseste-me a chorar, Rui.:(
EliminarQue soneto lindo e que saudades me trouxe da minha saudosa Mãe.
Na verdade, quantas vezes olhamos ao nosso redor e não vemos ninguém. Ninguém que se preocupe verdadeiramente connosco e com os nossos medos. Aqueles que guardamos bem lá fundo da alma e não deixamos transparecer.
Obrigada, Rui, por teres partilhado comigo, este belo poema. Mais valioso que a maior herança material. Imagino que devas ter muitas destas relíquias, tesouros legados pelo teu Pai querido.
Um beijinho grande e o meu muito, muito obrigada, Amigo Rui.
:)) Adorei que tivesses gostado ! :) ... e com este teu comentário quase, tu me puseste a chorar a mim ! ... :)
EliminarÉ um dos poemas (neste caso soneto) do livro "Avé Marias" .
Gostei muito, sim, Rui e já o guardei!:)
EliminarÉ mais uma recordação preciosa, a juntar a outras que tenho acumulado ao longo desta minha passagem pela blogosfera, onde as amizades me têm proporcionado momentos muito belos.
Grata por seres uma dessa pessoas, que me marcaram profundamente, pela positiva. :)
Uma época que me faz lembrar o estado melancólico e depressivo que muitas pessoas sentem. E, no entanto, deveria ser de alegria. Eu sei porquê, mas tb não vou dizer. : )
ResponderEliminarPois é, querida Catarina.
EliminarEsta época há muito tempo que representa, para mim, um período de saudade e melancolia.
Cresceram as crianças, grandes motivadoras do ânimo natalício, e partiram familiares.
Claro que sentimos a sua falta durante todo o ano, mas era nesta quadra que nos juntávamos. Mas o melhor é não pensar muito, senão dói mais.
Também sabes? Então, não digas. :)
Beijinhos, Catá!!
: )
EliminarEstá bem!
ResponderEliminarAbraço grande
Um beijinho, Ricardo!
EliminarO melro...
EliminarNão podes imaginar o que senti quando o li pela primeira vez.
Com o "Fiel" foi igual.
Não consigo explicar os sentinentos que quase me sufocavam.
Abraço grande
Há sentimentos que não conseguimos expressar em palavras ditas, nem escritas, às vezes. Sentimos, somente.
EliminarEu sei o que representam esses sentimentos, Ricardo. Já li muitos livros e poemas que me deixaram prostrada, sem fala.
Um grande, grande abraço. :)
"A Velhice Do Padre Eterno."
ResponderEliminarde Junqueiro
Eis uma boa prenda
para pôr no sapatinho
do Mundo inteiro
Amanhã é dia de compras
topas?
Concordo que, colocar no sapatinho do mundo inteiro, "A Velhice Do Padre Eterno" de Guerra Junqueiro, fosse uma belíssima prenda.
EliminarJá a ida às compras, lamento, Rogério, mas não topo, não!
Desde há uns tempos a esta parte que deixei de fazer compras nesta altura no ano.
Compro, na semana a seguir ao Natal, tudo por metade do preço.
Um abraço, poupadinho...:)
Beijinhos, boa semana, Janita.
ResponderEliminarHá memórias que são mesmo só nossas.
Sem a menor sombra de dúvida, Pedro!
EliminarBeijinhos, boa semana.
Guerra Junqueiro tão esquecido, tapado e abafado, de certo modo proscrito (como outros) pelos tempos nebulosos onde a "lei e a ordem" foram soberanas.
ResponderEliminarHoje e agora somente se exaltam (e bem) Pessoa, Eça ou Ramalho, esquecendo outros tanto ou mais "maiores" que estes.
Faz falta uma disciplina de LITERATURA no currículo escolar.
Beijokas rimando com sorrisos.
§- O Melro? É (devia ser) obrigatório conhecer.
Exactamente, Kok. Constatas uma grande verdade: a falha no nosso sistema de Ensino no que à Literatura diz respeito.
EliminarOs autores de 'Leitura obrigatória' ainda ia impondo aos garotos alguma forma de iniciarem nas obras de escritores portugueses, agora quais são os miúdos que lêem?
Daí a falta de vocabulário e escrita sem erros ortográficos.
Um beijinho, Kok. Obrigada pela visita. :)
A Janita tenha cuidado, a publicar estas coisas subversivas. Não vá aparecer-lhe pela calçada da noite o papão-capucho ou o homem do saco...
ResponderEliminarO certo é que o gajo continua a fazer das suas pelo mundo, apesar da quadra tão cheia de fraternidade, humanidade, caridade e muitos outros "ades"...
Bj de Boas-Festas.
Agostinho,
Eliminarestava mesmo a precisar de iluminar o rosto com um largo sorriso. Obrigada!
Boas-Festas, para si também e um beijo.
Nada de Ogro ou Papão!
ResponderEliminarO papa é Papai Noel
Que representa o papel
De piedoso ancião.
Vem num trenó contra-mão
E estaciona à revel
Ordem do povo infiel
Que o chama e não é cristão.
Tenho medo do meu medo
Que eu tinha de manhã cedo
No meu tempo de menino
O tempo muda e o segredo
Se transformou em brinquedo
Dado por um ser divino.
Grande abraço. Laerte.
Olá, Laerte.
EliminarGostei muito do seu belo Soneto. Obrigada.
Vejo com prazer que tenho mais um Poeta a caminhar ao meu lado, neste percurso onde a partilha e a amizade, são muito importantes. :)
Um abraço.