Não sendo bem das vermelhuscas, as brejeirices d'hoje estão a cargo de Bocage.
Um proprietário de uma casa de banhos, amigo de Bocage,
pediu-lhe que redigisse um letreiro para a tabuleta da casa. O poeta, sempre
gozador, escreveu:
“Banhos frios. Também os temos quentes para senhoras a 200
réis, com lençóis.”
O homem ficou muito contente e mandou pintar a placa.
Dias depois aparece novamente o dono da casa dos banhos ao
poeta, a dizer-lhe que os vizinhos não tinham gostado do letreiro, e seria bom
corrigi-lo.
Disse o poeta:
-Ponha, então, assim: “Banhos frios. Também os temos para
senhoras quentes de 200 réis, com lençóis”.
O homem ficou muito contente, mas correu a consultar os
vizinhos. Meia hora depois tornava ele a casa do poeta para lhe dizer que
os vizinhos acharam “pior a emenda do que o soneto”.
Bocage, aborrecido já com aquela história,
exclamou:
– Olhe, meu amigo, ponha então assim: “Banhos frios. Com
senhoras não queremos negócios quentes. Nem quentes, nem frios, nem por 200
réis, nem por nada, nem com lençóis, nem sem lençóis.”
*
Uma tarde, dirigiam-se para a Igreja - diz-se que a de São
Domingos - uns noivos, seguidos de numeroso cortejo nupcial. Iam a
pé, e a noiva ostentava enormes ramalhetes de flores de laranjeira.
Segundo constava, porém, a moça já não tinha o direito de
levar aquela flor, porque entre os grupos que presenciavam a passagem do
casamento, murmuravam que ela já estaria “de esperanças”…
O poeta Bocage assistia, quando os noivos pisavam
os degraus da igreja. Ao ver a noiva, riu-se e comentou com os amigos que lhe
estavam próximos:
– Façam o baptizado, que é melhor…
*
Este, é um conhecido poema do nosso Bocage:
Quer seja curto ou comprido
Quer seja fino ou mais grosso
É um órgão muito querido
Por não ter espinhas nem osso
De incalculável valor
Ninguém tem um a mais
E desempenha no amor
Um dos papéis principais
Quando uma dama aparece
Ei-lo a pular com fervor
Se é um rapaz, estremece
Se é velho, tem pouco vigor
O seu nome não é tão feio
Pois tem sete letrinhas só
Tem um R e um A no meio
Começa em C e acaba em O
Nunca se encontra sozinho
Vive sempre acompanhado
Por outros dois orgãozinhos
Junto de si, lado a lado
O nome destes porém
Não gera confusões
Tem sete letras também
Tem L e acaba em ÕES
Para acabar com o embalo
E com as más impressões
Os órgãos de que eu falo…
São o coração e os pulmões.
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Mas, para que se não pense que, do Manel Maria, tudo era desbocamento, palavrões e ordinarices, fica-vos um Soneto, revestido de algum sabor erótico, que eu gosto muito.
“Soneto do Prazer Maior.”
Amar dentro do peito uma donzela;
Jurar-lhe pelos céus a fé mais pura;
Falar-lhe, conseguindo alta ventura,
Depois da meia-noite na janela.
Fazê-la vir abaixo, e com cautela
Sentir abrir a porta, que murmura;
Entrar pé ante pé, e com ternura
Apertá-la nos braços casta e bela:
Beijar-lhe os vergonhosos, lindos olhos,
E a boca, com prazer o mais jucundo,
Apalpar-lhe de leve os dois pimpolhos:
Vê-la rendida enfim a Amor fecundo;
Ditoso levantar-lhe os brancos folhos;
É este o maior gosto que há no mundo.
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Feliz Fim-de-Semana!
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