A Cantadeira
Estranha-se? Eu
pergunto: a gente não se despe para amar? Porque não ficar nua para outros
amores? A canção é só isso: um amor que se consome em chama entre o instante da
voz e a eternidade do silêncio.
Outros cantadores, quando actuam em público, se
Outros cantadores, quando actuam em público, se
trajam de enfeites e
reluzências. Mas, no meu caso,
cantar é coisa tão maior que me entrego assim
pequenitinha, destamanhada. Dessa maneira, menos
que mínima, me torno sombra,
desenhável segundo
tonalidades da música.
Cantar, dizem, é um afastamento da morte. A voz suspende o passo da morte e, em
volta, tudo se torna pegada da vida. Dizem mas, para mim, a voz serve-me para
outras finalidades: cantando eu convoco um certo homem.
Era um apanhador de pérolas, um vasculhador de maresias. Esse homem acendeu a minha vida e ainda hoje eu sigo por iluminação desse sentimento.
O amor, agora sei, é a terra e o mar se inundando mutuamente.
Amei esse peroleiro tanto até dele perder memória. Lembro apenas de quanto estive viva. Minha vida se tornava tão densa que o tempo sofria enfarte, coagulando de felicidade. Só esse homem servia para meu litoral, todas as vivências que eu tivera eram ondas que nele desmaiavam. Contudo, estou fadada apenas para instantes.
Nunca provei felicidade que não fosse uma taça que, logo após o lábio, se estilhaça.
Sempre aspirei ser árvore.
Da árvore serei apenas luar, a breve crença de claridade.
Excerto do conto de Mia Couto,
Na Berma de Nenhuma Estrada
Era um apanhador de pérolas, um vasculhador de maresias. Esse homem acendeu a minha vida e ainda hoje eu sigo por iluminação desse sentimento.
O amor, agora sei, é a terra e o mar se inundando mutuamente.
Amei esse peroleiro tanto até dele perder memória. Lembro apenas de quanto estive viva. Minha vida se tornava tão densa que o tempo sofria enfarte, coagulando de felicidade. Só esse homem servia para meu litoral, todas as vivências que eu tivera eram ondas que nele desmaiavam. Contudo, estou fadada apenas para instantes.
Nunca provei felicidade que não fosse uma taça que, logo após o lábio, se estilhaça.
Sempre aspirei ser árvore.
Da árvore serei apenas luar, a breve crença de claridade.
Excerto do conto de Mia Couto,
Na Berma de Nenhuma Estrada
ResponderEliminarAdoro Mia Couto!
A foto da árvore é sui generis...
A Natureza é de facto caprichosa.
Beijinhos embrulhados numa concha.
(^^)
"O amor, agora sei, é a terra e o mar se inundando mutuamente."
ResponderEliminarO amor é isso, certamente!
Gosto tanto do estilo de Mia Couto! Tem uma forma de escrever tão diferente de tudo o que tenho lido até o “conhecer”.
ResponderEliminarÀ medida que ia lendo o excerto ia recordando...
Abraço
Feliz fin de semana y FELIZ AÑO 2013.
ResponderEliminarUn abrazo.
Tirar a roupa não é obrigatório para poder amar, basta usar a imaginação e as aberturas disponíveis. Beijoca, bom ano!
ResponderEliminarAmiga Janita, parabéns pela escolha de tão belo e sensível texto.
ResponderEliminarMia Couta tem uma maneira única e especial de escrever.
"Sempre aspirei ser árvore", como não consigo pouso levemente nos seus ramos.
Querida amiga, desejo-te o MELHOR para 2013! Muita saúde e força para suportar as dificuldades que se advinham.
beijinhos e até 2013!
Fe blue bird
Amiga se quiseres que te faça um cabeçalho para o teu blogue é só mandares-me um email a dizeres-me o que pretendes,tenho muito gosto nisso, combinado?
bjs
Olá, Janita!
ResponderEliminarO texto é magnífico: como que um misto de sabor a encantamento e desencanto - que se combinam lindamente.
Confesso que de Mia Couto pouco ou nada li, e que também em matéria de leitura estou a ficar preguiçoso...Mas agora que o conheci acho que vou lê-lo, pois que gostei muito do que aqui vi.
Linda escolha!
E para terminar, os meus votos de "FELIZ 2013", com saúde e alegria - mais tudo aquilo que possas desejar.
Beijinhos amigos; fica bem
Vitor
Mia Couto escreve muito bem e é uma pessoa de uma enorme simpatia. Tive oportunidade de constatar isso quando pude conversar com ele um pouco, duranre uma Feira do Livro, em Belgrado, dedicada à língua portuguesa e ele era um dos que ali estava. Foi muito interessante, pois falei também com a Lídia Jorge, a Alice Vieira e o Rui Zink.
ResponderEliminarVim da “garagem” do Luciano e, depois da Aurea descalça, dou aqui no “cantinho” com este texto a ligar tudo, a música, o corpo exposto, o Luciano amarrado ao mastro alto para não se perder com as sereias, a Janita nostálgica sempre com a sua longa faca na carteira, gatos no cio a roçarem-se pelas pernas dos móveis e das pessoas, palavras barradas com manteiga de ervas, imagens vistas por janelas com lingerie no lugar das vidraças…
ResponderEliminarVenha o novo ano, está tudo bem.
Beijo.
A tua sensibilidade está na excelente escolha deste texto de Mia Couto, gosto imenso, ele faz parte das nossas leituras cá de casa.
ResponderEliminarbeijinho e uma flor
Es un poema tan bonito,mezclando la tierra y el amor el cual no hace falta desnudarse, lo único que hace falta es desnudar el alma y el corazon.
ResponderEliminarSaludos
Será que neste nome o "ou" pode ser substituído por "oi"?...
ResponderEliminarPor acaso conheço uma Patrícia Coito. AHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAH.
EliminarZé, só tu para conseguir extrair comédia de um post sério.
Desculpa Janita mas... não resisti. :DDDDDD
Beijinhos
(espero que tenha tido uma excelente "entrada no novo ano". Tive que dizer "entrada no novo ano" porque se só tivesse dito "entrada" de certeza que o nosso amigo Zé levaria a coisa para uma nova brincadeira... talvez mais marota. lolololololololol)
LOL:
EliminarPois é, a Janita não achou lá muita piada...
Eu sou como Nietzsche, aquele que escala os mais elevados montes, ri-se da tragédia da vida.