domingo, 29 de janeiro de 2017

Os Afectos Não Se Gastam...

Quando Saint-Exupéry escreveu que, ao matar um jardineiro, matamo-lo uma vez, mas quando destruímos o seu jardim matamo-lo duas vezes, percebemos que se refere a obras e paixões humanas, à entrega, àquilo que construímos durante a vida. É claro que a paternidade se adequa na perfeição à frase de Saint-Exupéry. Matarem uma pessoa é matarem-na uma vez, mas se matarem os seus filhos, matam-na de um modo difícil de contabilizar. Neste caso teremos de ser benevolentes com a matemática. A ideia de paternidade é um prolongamento óbvio da vida individual, que retira os progenitores do centro e os coloca na periferia.
     Quando partimos um pão ao meio ficamos com duas metades. Com o amor pudemos fazer o milagre de amar cada um dos nossos filhos de modo absoluto, sem dividir esse mesmo amor em duas metades. As paixões abominam a matemática. Nestas coisas, podemos partir o pão ao meio e ficar com dois pães inteiros. Amar é um milagre bíblico.
Os afectos não se gastam quando são partilhados, como aconteceria com qualquer riqueza material. Esse fenómeno, ainda que vulgar, não deixa de ser estranho, e em certa medida miraculoso.
     Uma paixão pode ser infinita, eterna, absoluta. Sentimo-la assim muitas vezes. Racionalmente, não conseguimos apreender o infinito senão com signos, metáforas e analogias.
     Por causa desta condição absoluta, muitas vezes sentimos que criar alguém implica uma responsabilidade total, mais importante do que a vida individual.

     Rousseau abandonou quatro dos seus filhos num orfanato, com a lamentável desculpa de que não seria um bom pai para eles. Mais tarde escreveu todo um tratado sobre como educar uma criança.
Em certa medida, este desfasamento entre potência e acto, mesmo que se apresente em proporções e dramatismos diferentes, é relativamente comum. 

Há pessoas que sabem exactamente como educar um filho, mas na prática revelam-se péssimos pais; e outras que, não tendo a mínima noção do que estão a fazer, são excelentes. Eu, a maior parte das vezes, divido-me entre estes dois tipos de pessoas.
    
 Partir Pães  -  Crónica de Afonso Cruz*

(transcrita da revista Notícias Magazine, de hoje)


 * Escritor


Nota: Gostaria que, relativamente ao último parágrafo desta crónica, que foi escrita por um pai, mas considero indiferente ser qualquer um dos progenitores, qual a vossa opinião em relação à educação. Saber educar tendo em conta os conhecimentos teóricos de pedagogia, com todos os princípios e técnicas da educação, ou educar guiados pelo instinto e o bem-querer?
Pode parecer uma pergunta sem grande sentido, mas acreditem que não é! :)


18 comentários:

  1. O instinto da paternidade/maternidade supera o "conhecimento", embora este ajude, sem dúvida.

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    1. Não podemos esquecer que, quando o "conhecimento" não existia em livros e compêndios, se formaram homens de 'barba rija' e carácter impoluto...:)
      Beijinhos, boa semana e obrigada. José!

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  2. Não há propriamente manuais que se possam seguir e que se apliquem a todos os pais e/ou a todas crianças. Sigamos o nosso instinto maternal/paternal e – nas horas vagas – façamos por ler algo sobre a psicologia infantil. O estar-se presente tanto quanto possível ajuda bastante no relacionamento entre pais e filhos. E nem tem que ser sempre “tempo de qualidade”. Depois, quem tem mais que um filho, vai chegar à conclusão que, afinal, mesmo tendo sido educados da mesma maneira, acabam por ser muito diferentes!! : ))) Que sejam saudáveis, felizes e cidadãos produtivos da sociedade é o que é importante.

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    1. Não há manuais, não Catarina! Podem existir livros que auxiliem os jovens pais a saber lidar com situações mais delicadas, mas o amor, a atenção e a disponibilidade, falarão sempre mais alto a favor da formação da criança. Penso, eu! :)

      Beijinhos, e obrigada, Catá! ;)

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  3. Eu penso que não há manual que supere os instintos de bem querer. Se os pais forem suficientemente adultos para saber que bem querer, não é tornar-se escravo das vontades do filho.
    Um abraço e uma boa semana

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    1. Nem mais, Elvira. Hoje, vemos muitos pais submetidos aos caprichos dos filhos, por uma questão de comodidade. Educar dá trabalho, exige tempo, firmeza nas decisões e muita dedicação.
      Sem generalizar, claro! :)

      Um abraço e obrigada!

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  4. talvez seja muito instintivo, e o problema seja esse, a sociedade está a perder os instintos. nã sou pai, mas acredito que podia ser um bom pai, nã quer dizer que seria um pai exemplar :) talvez um pai-avô daqueles que permite muito! mas custa-me o abandono das crianças nas instituições de ensino. ouço histórias de miudos com 5 anos entregues a centros de explicação e pré-primária durante 10 horas por dia. é um absurdo ter filhos para os deixarem entregues a outros, daí achar que falta instinto, falta amor, e o conhecimento nã o substitui.

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    1. Gostei tanto que tivesses vindo expor o teu ponto de vista acerca deste tema, Manel.:) Essa tua expressão de 'pai-avô', para dizer que serias tão permissivo quanto são os avós, que costumam afirmar que os pais é que educam e os avós mimam, encheu-me as medidas...:)
      Mas tens razão quanto à indisponibilidade de tempo dos pais que leva à permanência excessiva de crianças tão pequenas em instituições de ensino. Por muito eficientes que sejam, nada substitui o amor e o carinho dos pais. É esse o preço a pagar pela necessidade de ambos os pais trabalharem fora de casa. Vale, em alguns casos, o apoio dos avós.

      Um beijo e obrigada, Manel.:)
      Boa semana.

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  5. Os princípio pedagógicos, as técnicas da educação são orientadores mas cada ser humano (pai ou filho) é único e faz a sua própria aprendizagem de como criar/educar os filhos. Acho que ninguém sabe com absoluta certeza qual a melhor forma, no entanto adota a que, no momento, lhe parece melhor.

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    1. Certamente,Luísa. Até porque se fosse a educação orientada apenas por técnicas, nunca resultaria, uma vez que as crianças não têm todas a mesma personalidade. Há que usar a percepção das necessidades de cada uma e agir em conformidade. :)

      Obrigada, um beijo, Luísa.

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  6. Saber "educare e educere" é o fundamental para um desenvolvimento sadio e que abranja todas as potencialidades da criança...

    bom dia

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    1. Ora aqui está uma opinião de quem sabe das coisas. Penso que 'educere' será o ter a noção das potencialidades da criança e ajudá-la no surgimento das mesmas...Sim senhor!!

      Obrigada, Moonchild. :)

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  7. Quem sabe como educar um filho tem todas as condições para ser um bom pai/mãe.

    Boa semana, Janita.
    Beijinho

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    1. ...E saber educar significa dar amor, orientação e saber incutir na criança o sentido de responsabilidade, não é, António? Nem mais! :)

      Beijinhos e obrigada.
      Boa semana.

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  8. Para mim que não tenho filhos mas que lido com os filhos dos outros acredito que o instinto é tão importante como o conhecimento depois junto-lhe o bom senso e por fim: acompanhamento e amor.
    Relembro que amor não é dizer que Sim a tudo e acrescento que acima de tudo as crianças repetem o que vêem em casa.. e muitas vezes quando conheci os pais (mãe ou pai) revi os seus filhos.....para o bem e para o mal! Janita, isto vale o que vale é apenas uma opinião de uma treinadora de ténis de crianças entre os quatro e os oito anos :)))bjs

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    1. A tua opinião vale o que vale - como dizes - e vale muitíssimo, Papoila. Porque é baseada na experiência, na constatação objectiva e porque tudo o que dizes faz todo o sentido.
      Obrigada por isso.

      Beijinhos. :)

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  9. Se pudermos melhorar instinto com conhecimento... temos o problema da educação dos filhos tendencialmente resolvido. Mas a tendência de racionalizar, de normalizar, de capar, dá cabo de tudo. O homem antes de ser racional é emocional e instintivo. Não podemos esquecer isto.
    Mas, há muita gente que anda convencida que educação é ciência...
    Beijo.

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    1. "O homem antes de ser racional é emocional e instintivo. Não podemos esquecer isto"

      Nem mais, Agostinho, felizmente!

      Beijinho e obrigada. :)

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