Foto Minha |
Como nuvens pelo céu
Passam os sonhos por mim.
Nenhum dos sonhos é meu
Embora eu os sonhe assim.
São coisas no alto que são
Enquanto a vista as conhece,
Depois são sombras que vão
Pelo campo que arrefece.
Símbolos? Sonhos? Quem torna
Meu coração ao que foi?
Que dor de mim me transtorna?
Que coisa inútil me dói?
Passam os sonhos por mim.
Nenhum dos sonhos é meu
Embora eu os sonhe assim.
São coisas no alto que são
Enquanto a vista as conhece,
Depois são sombras que vão
Pelo campo que arrefece.
Símbolos? Sonhos? Quem torna
Meu coração ao que foi?
Que dor de mim me transtorna?
Que coisa inútil me dói?
***
Poema in “Poesias Inéditas” da autoria de Fernando Pessoa:
O mais universalizado dos poetas portugueses
desde Camões,
o mais influente, o mais lido, o mais intrigante!
_____________
Em jeito biográfico, para o leitor interessado ir degustando durante o fim-de-semana.
Fernando Pessoa, poeta bilingue, cidadão português ambíguo porque, no fundo, eterno estrangeiro em toda a parte, há-de continuar a ser, por muitos anos, o pretexto para uma bibliografia abundante e de qualidade variada: desde a inevitável e volumosa tese de doutoramento que poderá ou não acrescentar alguma coisa à compreensão profunda do poeta, até à delirante descoberta biográfica que há-de pretender demonstrar ter o poeta pertencido, afinal, no sector do vigor sexual, à categoria conhecida do 'português valente' e, está claro, imbatível. Pessoa tem dado, dá e continuará a dar para tudo.
Nascido em Lisboa, em 13 de Junho de 1888 e falecido, 47 anos depois, em 30 de Novembro de 1935, a vida de Pessoa consistiu, por assim dizer, em não haver vida. Não casou, não teve filhos, não é mesmo certo que tenha praticado, com alguma convicção, aquele acto de que pode resultar o nascimento de filhos, não teve emprego certo, não teve, tirando Mário de Sá-Carneiro, amigos que se pudessem considerar íntimos, não concluiu um curso superior, não viajou. A sua vida foi, uma sucessão ininterrupta de não aconteceres, só dramaticamente entrecortados, uma vez pelo suicídio de Sá-Carneiro. Bebeu muito – alguma coisa havia de ter feito em excesso.
O pai, Joaquim de Seabra Pessoa, era um pequeno funcionário, mas inteligente, lido e musicalmente dotado de cultura suficiente para se dedicar à crítica de música; a mãe, Maria Madalena Pinheiro Nogueira, era de boa cepa açoriana e recebera refinada educação.
O pai faleceu em 1893, tinha o futuro poeta 5 anos. Dois anos depois a mãe casa, em segundas núpcias, com João Miguel Rosa, cônsul português em Durban, a ele se indo juntar no ano seguinte. Entre 1896 e 1905, Fernando Pessoa faz os seus estudos em escolas inglesas recebendo, em 1904, o Prémio Rainha Vitória por um pequeno ensaio em inglês, como parte do exame de admissão à Universidade do Cabo.
Em Agosto de 1905, regressa sozinho a Lisboa para frequentar o Curso Superior de Letras da Universidade de Lisboa. É sol de pouca dura, vindo a abandonar o referido curso ao fim de poucos meses.
A vida, o amor, a amizade, a Língua, a realidade do mundo, a literatura, iam ser, pela vida fora, territórios estrangeiros, não-evidências a investigar.
Nada lhe seria nunca dado numa bandeja. Tudo tinha sido, era, iria ser, motivo de assombro. Na alma, aceitar é perder.
Na perpétua exploração desse assombro estará a raiz da sua prodigiosa produção em verso e em prosa, prosseguida nos intervalos da sua mais ou menos errática profissão de correspondente comercial em línguas estrangeiras (inglês, sobretudo).
Se um homem conseguir escrever como vinte homens diferentes, ele será vinte homens diferentes (...) e os seus vinte livros estarão em ordem.
Eis, em poucas palavras, a 'justificação' da sua famosa 'invenção' dos heterónimos, invenção que não foi, como se sabe, sua, embora ele a tenha levado a um tal paroxismo de intensidade e explicitação que, de algum modo, a fez nova e, por aí, a fez sua.
(...) "se me conheço, deveria dizer que não tenho de todo personalidade... Sou tão mutável, sendo tudo à vez e nada por muito tempo – sou uma tal mistura de bem e de mal, que seria difícil descrever-me".
Fernando Pessoa, repete-se, até pela multiplicação que deu à personalidade, criando cerca de trinta diferentes pessoas de vária importância, deu estatuto adulto à invenção e iluminou-a com uma intensidade capaz de nos fazer ter dela uma espécie de consciência nova, o que levaria John Pilling a afirmar ser o autor de Mensagem 'o mais múltiplo de todos os poetas modernos'.
Por outro lado, teve o cuidado meticuloso e, pelos vistos, frutuoso, de mitificar, em devido tempo, a sua própria invenção, na famosa e inspirada carta que escreveu a Adolfo Casais Monteiro , na qual confere ao dia 08 de Março de 1914 o estatuto de data-viragem nos anais da história literária pessoana e portuguesa, o dia do aparecimento tumultuoso e imparável da série de poemas a que deu o título de 'O Guardador de Rebanhos,' cujo autor, Alberto Caeiro, pagão de espécie complicada e simples, se revela, desde logo, seu mestre. Mestre que o será também, confessadamente, de Ricardo Reis e de Álvaro de Campos.
Cunhando medalha para a posteridade, Álvaro de Campos proclamará com o exagero militante que competentemente cultivava: "O meu mestre Caeiro não era um pagão: era o paganismo". E o próprio Pessoa fará o panegírico exaltado do seu mestre, em termos igualmente extremistas: Pascoaes virado do avesso, sem o tirar do lugar onde está, dá isto – Alberto Caeiro deixa-nos perplexos. Somos arrancados à nossa atitude crítica por um fenómeno tão extraordinário. Jamais vimos algo de parecido com ele.
Inventado Caeiro, Pessoa tratou de lhe descobrir uns discípulos. Assim nasceram Ricardo Reis e Álvaro de Campos.
Reis é, como Caeiro, pagão, mas tem, ao contrário do outro, rigor e densidade.
Campos é o engenheiro graduado em Glasgow, futurista, amante do mundo moderno e aerodinâmico, oscilando entre a depressão e a histeria, desprezando os homens porque não brilham nem ostentam a simplicidade eficiente das máquinas:
"Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime.
Ser completo como uma máquina! Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!".
Jogando o jogo em que se fez Mestre consumado, Pessoa traçaria, ele próprio, o perfil magistralmente recortado de Álvaro de Campos.
Gostei de ler! Nunca estudei o Pessoa, fugi sempre dele a sete pés, por ser um poeta e não querer nada com a poesia. De poetas bastou-me o Camões que me deu cabo da nota de Português no exame do 5º Ano. Nunca mais quis ligação a nenhum!!!
ResponderEliminarE é preciso ter ligação a alguém, neste mundo de Cristo, para se admirar e gostar das coisas belas que lemos e gostamos?
Eliminar: ))
Já degustei!
ResponderEliminarPessoa é fundamental.
Beijinhos, Janita.
Se calhar leste na diagonal, António!
EliminarVê lá bem, olha que eu vou fazer uns teste desta matéria . : )
Beijinhos.
Uma bem explanada dissertação sobre a biografia de Pessoa, um poeta que se desdobra em vários poetas. Mais do que quatro em um porque todos diferentes, como os vários filhos do mesmo casal.
ResponderEliminarNão é a convicção no ato sexual que faz filhos. Deixou manifesto um amor platónico e pode muito bem ter sido assexual por aquilo que diz.
Abraço de amizade.
Juvenal Nunes
Olá, Juvenal!
EliminarPessoa desdobra-se em várias cabeças pensantes, tudo partindo de uma só mente: a sua! Mas tão versátil, tão contraditória em si mesma, que consegue dar autenticidade a cada um dos seus heterónimos.
A intimidade do Poeta ficará sempre envolta em mistério, pelo que apenas podemos criar suposições.
Um abraço e um bom fim de semana, amigo Juvenal.
Gostei da biografia e mais ainda das nuvens! Lindas! beijos, chica
ResponderEliminarSe gostaste assim tanto da nuvens, querida Chica, podes levá-las quando quiseres. Afinal, tudo o que vemos no Céu, é de todos!! : )
EliminarBeijinhos e bom fim de semana
Vim avisar que tem céu teu por lá!Acaba de entrar! Obrigadão! beijos, chica
Eliminarhttps://ceuepalavras.blogspot.com/2024/07/blog-post_21.html
Pessoa, esse poeta de tantos "eus"
ResponderEliminaré um poeta que releio regularmente juntamente com Camilo Pessanha, Charles Baudelaire e Torga entre outros mais próximos
Verdade! Tantos EUs, todos diferentes, sendo só um. É obra!
EliminarA poesia em prosa, que o Zaratustra escreve, denota que gosta, e muito, de ler bons Poetas.
Um abraço, com votos de bom fim de semana.
Não os contei, mas garanto que foram uns largos minutos muitíssimo bem passados aqui no seu cantinho!
ResponderEliminarLi que vai fazer perguntas sobre este homem que ninguém pode dizer que não era uma criatura extremamente original, ame-se ou odeie-se a sua poesia.
Amanhã volto cá :)
Obrigada e um forte abraço!
Para quem tão pouco 'sai de casa', é um gosto e um privilégio saber que a Maria João gostou de passar uns minutos na minha e na companhia de Pessoa. Muito grata por isso!
EliminarVenha sempre que possa e desejar, será sempre bem recebida,
mas isso das perguntas, foi só para 'obrigar' o António a vir ler novamente com atenção. Eheheheh
Um grande e grato abraço.
E eu que vinha toda preparada para o "ponto", rsrsrsrs :)
EliminarMas sempre vejo, aqui em baixo, uma réplica do Rogério a Pessoa seguida de outra réplica sua ao Rogério... que faz anos hoje??? :o Ai, eu e a minha eterna incapacidade de me recordar dos aniversários todos, incluindo o meu. :(
Um grande abraço!
Réplica a Pessoa
ResponderEliminarComo nuvens pelos céus
Passam os sonhos por mim.
Todos esses sonhos são meus
Pois eu os sonho assim.
Beijo
E sonhando assim os teus Sonhos
EliminarSonhos que mais ninguém tem
Não há réplicas que repliquem
Os sonhos que eu sonho também!
Beijinhos e Parabéns pelo dia de hoje, Rogério.
(Infelizmente, desde há dois anos - e sabe-se lá até quando - enegrecido pela sombra da mão criminosa que mandou bombardear Mariupol )
Fizeste um post fantástico que me levaram às nuvens, apesar de não gostar muita coisa da obra de Pessoa por ser imensamente triste. Gostei do poema que apresentas.
ResponderEliminarBeijos e um bom sábado
A versatilidade de Pessoa confunde-nos. Daí nem todos os seus poemas nos agradarem, de uma maneira geral.
EliminarBeijinhos e obrigada, Fatyly.
Bom dia
ResponderEliminarNão conhecia a biografia do poeta , mas nunca é tarde para se saber mais algo sobre os nossos bons antepassados .
A foto está 5*****.
JR
Boa tarde, JR!
EliminarCom tudo e com todos aprendemos não é?
Um abraço.
Pessoa é múltiplo, por isso é inesgotável.
ResponderEliminarEu, que até o conheço razoavelmente, estou sempre a descobrir novos poemas!
Abraço
Uma boa apreciação a tua, Leo.
EliminarUm abraço.
PARABÉNS A VOCÊ NESTA DATA QUERIDA MUITAS FELICIDADES E ANOS DE VIDA...é o meu desejo amiga❤❤❤🎁🎁🎈🎂🤲🤲😘😘😘
ResponderEliminarUm bom dia
Como soubeste? : )
EliminarEste ano fiquei caladinha para não roubar protagonismo ao Pessoa, mas de nada adiantou!
Cá estou eu na ribalta e o pobre Pessoa quase ignorado! : ))
Obrigada, obrigada, obrigada!!
Beijinhos. 😘😘
Muito fácil no ano passado quando fizeram o que fizeram assentei no calendário de folha a folha que está aqui nesta secretária. Também tens de ter o teu dia de protagonismo😂😘
EliminarBeijos e um bom dia
E pronto! Está explicado o mistério, embora não consiga lembrar-me do que foi que fizeram no ano passado. Esta minha cabeça já não é o que era.
EliminarDeixa lá, o que importa é que fiquei para sempre na tua secretária e na tua mente. Há lá protagonismo maior? Nem Pessoa!!
Beijinhos😘😘😘
Há poemas do FP e seus heterónomos de que gosto,
ResponderEliminarMuito bem ao descrever a pessoa do Pessoa.
Hoje, um beijinho especial
Heterónimos e não heterónomos
EliminarHoje foi tudo novo e especial para mim, José.
EliminarAté caminhar apressada à chuva e conseguir chegar ilesa ao restaurante. Imagine!
Um beijinho e o meu muito obrigada.
Bom dia.
ResponderEliminarGostei de ler a biografia.
Vários homens num só.
E vim aqui para lhe desejar um Feliz Aniversário.
Se não fosse ao meu cantinho, e não era o blog o aniversariante, mas a Maria Araújo, não saberia que é hoje o seu dia, querida Janita.
Eu não esqueço as pessoas que se sentaram à mesa com o nosso falecido e muito querido amigo, Rui.
Está connosco.
Um abraço.
Mais Araújo
É verdade, Maria. Fiz uma confusão danada, ou pensei fazer, quando, afinal, estava certa!
EliminarEstá sim, o nosso Amigo Rui viverá nos nossos corações enquanto nós vivermos.
Muito grata, Maria Araújo, pela sua gentileza.
Um grande beijinho
Alguém fez anos?!
ResponderEliminarMuitos parabens!
“Tudo vale a pena, se a alma não é pequena.” Talvez seja a frase mais citada que aprendemos bem cedo.
Gostei de ler esta publicação. Há sempre algo que se aprende. : )
Até à meia-noite ainda é 25 de Fevereiro, Catarina, logo não 'fez' ...faz! : )
EliminarHoje, quem está lacónica sou eu, mas tal como Álvaro de Campos; 'o que há em mim é sobretudo cansaço' . : ))
Beijinhos
Fazes anos?
ResponderEliminarMuitos parabéns e as maiores felicidades!
Abraço festivo
Olha que já são tantos que nem me apetece falar neles, nos anos. Só festejá-los, que disso gosto muito! : )
EliminarMuito grata pelos desejos de felicidades, que poderiam não ser as maiores, mas ser um pouco mais.
Um beijinho grande, querida Leo!
Bem-hajas!
e porque ainda estou dentro do prazo legal, aqui ficam os meus parabéns
ResponderEliminar:)) de qualquer modo viria sempre a tempo, Zaratustra.
EliminarObrigada!
Boa semana!
Está mesmo a chegar a meia noite e, portanto tenho de me apressar. Parabéns, querida Janita, que o teu dia tenha sido alegre na companhia dos teus e que tenhas comido uma boa fatia de bolo, acompanhado de um bom champanhe. Deixo-te um beijinho muito especial, carregadinho de amizade e os meus votos de que a vida te abençoe com boa saúde, para que, no próximo ano , aqui estejamos para novos festejos PARABÉNS!
ResponderEliminarEmilia 🥂 👏 🎈 🌻
Ora, querida Emília, vieste a correr sem necessidade. : ))
EliminarTens aqui o teu lugar cativo, vens sempre a tempo!
Muito obrigada e um grande beijinho!!